Petroleiro relata o dia-a-dia de um cipista dentro de uma unidade do sistema Petrobrás

Eleições da cipa

Tendo em vista a proximidade do processo eleitoral para a terceira gestão da CIPA do EDISA, o sindicato entrevistou o engenheiro de petróleo Anderson Pereira (“Mancuso”), que foi cipista vice-presidente da última gestão da CIPA dos prédios do antigo complexo Edisa e também da primeira gestão do atual EDISA no Valongo. As inscrições para os candidatos à CIPA começam no dia 22 de março e vão até o dia 10 de abril.
A eleição ocorrerá do dia 12 de abril até o dia 2 de maio. A apuração será feita no dia 3 e a divulgação dos nomes eleitos para a CIPA no dia 4 de maio.

1)Qual a motivação em participar da CIPA?
A possibilidade de avançar concretamente nas condições de saúde e segurança de todas e todos trabalhadores, principalmente através da prevenção. Se a motivação for a estabilidade no emprego (o que na prática não é cumprido) ou a projeção pessoal,  muitas chances do/da cipista ter uma participação somente para cumprir protocolos.

2) Como é  o dia-a-dia de um cipeiro?
Além de participar ativamente nas reuniões da CIPA, o cipista participa das inspeções nos locais de trabalho, elabora mapa de risco, participa de comissões de investigação de acidentes e elabora diversas atividades de conscientização e debate sobre saúde, segurança, meio ambiente e mundo do trabalho. As tarefas prevencionistas devem ser realizadas sempre ouvindo as demandas colocadas pelos trabalhadores.  Em termos de HH, o cipista deve se dedicar no mínimo em 30% das suas horas de trabalho para poder cumprir minimamente as tarefas necessárias, mas o ideal é que fosse liberado completamente para os trabalhos da CIPA durante o ano do mandato.

3) Quais foram as principais mudanças ocorridas na CIPA do EDISA?
Mudamos de um complexo de prédios com 400 trabalhadores para um único prédio com quase 2000 trabalhadores, isto ajuda na integração entre as pessoas. E respeitando a NR-5, a composição da CIPA também mudou, saltamos de 1 para 4 o número de representantes efetivos dos trabalhadores eleitos.  A mudança trouxe também muitos desafios.

4) Poderia comentar um pouco mais sobre os desafios para a CIPA com a mudança?
A CIPA tem uma importância enorme nos ajustes necessários às novas instalações: novos mapas de riscos, análise de uma maior quantidade de áreas operacionais como casas de máquinas, de refrigeração de água, salas e subestações elétricas e outras áreas como jardins, docas e subsolos. O local onde estamos também nos obriga a redobrar a atenção sobre os incidentes e acidentes ocorridos no trajeto e nas áreas externas. Além de ajudar nas questões físicas internas e externas, muitos outros desafios estão colocados.

5) Qual o papel da CIPA para além da análise das condições físicas dos locais de trabalho?
Ótima pergunta. Muitos pensam que os trabalhos da CIPA se resumem na análise física dos espaços. A CIPA representa pessoas que passam por muitas situações adversas no trabalho: saúde mental deteriorada por questões relacionadas ao trabalho, assédio moral e sexual, machismo, racismo e lgbtfobia. Lembro que em algumas gestões da CIPA eram quase que proibido falar em assédio moral. Todas estas situações degradam as condições de saúde no trabalho e podem gerar acidentes e afastamentos. Não é necessário sangrar para comprovar dor, sofrimento e adoecimento no trabalho.

6) Houve algum trabalho da CIPA na questão de saúde mental e de diversidade cultural?
Participei da organização de duas SIPAT (Semana Interna de Prevenção de Acidentes). A primeira em 2013 com o tema “Saúde Mental, Trabalho e Contemporaneidade”, foi uma das primeiras CIPAs na empresa a abordar este tema. Dentro da semana, foram incorporadas atividades sobre as diversas opressões reproduzidas nos locais de trabalho. A segunda em 2015 com o tema “Inquietações sobre Acidentes de Trabalho”, nela foi debatido por que os acidentes acontecem e foi discutida a abordagem organizacional na análise de acidentes, muito diferente da abordagem praticada pela empresa que é muito focada nas causas imediatas.

7) Qual o papel do representante dos empregados na CIPA?
Temos que perder a ingenuidade em acreditar que não existem conflitos de interesses entre empresa e trabalhadores, mas isto não implica que os espaços da CIPA devam ser beligerantes. No entanto, um ponto crucial é entender que os representantes do empregado devem garantir que a CIPA seja um espaço classista, ou seja, para defender os trabalhadores a partir da perspectiva dos trabalhadores, senão a CIPA se equivale a mais um espaço da empresa onde predomina a atual política punitivista perante aos acidentes, como prega a atual sistemática de tratamento de conduta em SMS.

8) Poderia falar como a atual sistemática de tratamento de conduta em SMS afeta os trabalhos prevencionistas? E além dela, quais os fatores hoje que atrapalham o trabalho da CIPA?
Ela contribui para a subnotificação de acidentes, pois seu principal termômetro é a culpabilidade individual. Ela se baseia na análise da circunstância para classificar a reação. As ações de gestão tomadas, além da punição, se resumem na verificação de procedimentos e treinamentos, não aprofunda a análise organizacional dos acidentes, ou seja, na análise de como a falta de investimentos, a diminuição do quadro mínimo de trabalhadores e as insatisfações diversas impactam diretamente nos acidentes. Desta forma, a atual política de desinvestimentos e a alta velocidade da privatização da empresa também vão na contra mão de um compromisso sincero com a vida.

9) Quais foram  os pontos críticos na primeira gestão da CIPA do EDISA?
A primeira gestão foi bastante intensa. Muitas tarefas e muitas ações foram realizadas. Foram muitos pontos críticos, destaco aqui a segurança nos elevadores, a segurança no espaço das docas, a sinalização no estacionamento, o mau cheiro no ambulatório e a qualidade de água nos bebedouros. A integração com a CIPA das contratadas é um ponto bastante importante. Os contratados sofrem muito mais com as condições precárias de trabalho. Por exemplo, nesses últimos anos só vimos os salários das trabalhadoras da limpeza diminuírem e pior, com a diminuição do quadro de funcionários. E permanecem os tradicionais calotes que as empresas dão nos seus trabalhadores.

10) Como você avalia o trabalho da segunda gestão?  Quais as perspectivas para uma terceira gestão da CIPA?
Percebo que houve muitas dificuldades nesta segunda gestão. As atividades da CIPA ocorreram de forma muito fragilizada. Mesmo com verba disponível, não foi autorizado o repasse para financiar as atividades da SIPAT 2016, acarretando numa SIPAT bem esvaziada e com poucas atividades. Houve troca na presidência da CIPA e em minha opinião, a presidente que assumiu se mostrou muito menos engajada nos trabalhos da CIPA.  Absurdos aconteceram como as proibições na entrada de representantes do sindicato para participar das reuniões da CIPA e como a questão do cancelamento da atividade sobre AIDS por conta da solicitação do uso do auditório pela gerência geral da UO-BS. As perspectivas para a terceira gestão não são das melhores com a continuidade da política de desinvestimentos e a redução no número de funcionários. Hoje, por exemplo, assistimos uma desintegração do compartilhado e a gerência de SSMS-BS diminuindo drasticamente seu quadro de técnicos de segurança do trabalho. A ordem do dia é alocar em espaços não previstos as estações de trabalho para funcionários vindos de todo o país, .oriundos da política de reestruturação e desmobilização dos nossos ativos. Neste cenário, se nós não nos mobilizarmos, se nós não barrarmos o desmonte em curso da nossa empresa, estaremos ajudando a construir uma Petrobrás sem compromisso com a vida e com a soberania nacional.

11) Qual o recado final para novos interessados em participar da CIPA?
A renovação e a participação são fundamentais para a CIPA. A CIPA foi fruto de uma história de lutas que ainda estamos escrevendo e deve ser uma ferramenta para avançar e não para retroceder na segurança e saúde dos trabalhadores. Para isto é importante a participação de todas e todos nos trabalhos da CIPA e no apoio às candidaturas que estão realmente comprometidas com a vida dos trabalhadores.

 

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