PCR ou PCAC? Uma visão jurídica

Entrevista

Entrevista com o Doutor CÉSAR VERGARA DE ALMEIDA MARTINS COSTA: uma visão jurídica do impacto de adesão ao PCR ou manutenção no PCAC

A Petrobras apresentou o Plano de Carreiras e Remuneração (PCR) cujo objetivo é, dentre, outros, o de favorecer a mobilidade funcional. A proposta é composta por 4 (quatro) fundamentos: Eixos de Atuação Profissional, Competências (Gerais e dos Eixos), Categorias e Cargos Amplos. Segundo a empresa, “Os empregados que aderirem ao PCR passarão a ter um novo regramento de progressão na carreira”.

Basicamente, o PCRcria uma categoria a mais – máster -, cria apenas dois cargos: técnico e superior, com atribuição de ênfases na respectiva área de formação; não permite a mudança de ênfase do profissional júnior; não permite a evolução na carreira de técnico para nível superior, salvo mediante concurso público externo e nela há uma visível alteração na política de concessão de promoções por antiguidade e merecimentos que no Plano de Classificação e Avaliação de Cargos (PCAC) atual se dão a cada 12, 24, 18 meses e no PCR se darão na escala 12, 36 e 60 meses. 

A AEPET entrevistou o Doutor CÉSAR VERGARA DE ALMEIDA MARTINS COSTA, OAB/RS 28947 – AB/RJ 148292-A, para que você tenha uma visão jurídica do impacto de adesão ao PCR ou manter-se no PCAC.


AEPET: A Petrobras pode propor o novo Plano de Carreiras e Remuneração (PCR), e estabelecer modalidades diferentes do Plano de Classificação e Avaliação de Cargos (PCAC), sem participação dos empregados na formulação do PCR?

Dr. Vergara: De modo geral, a atribuição de funções do empregado pelo empregador está contida no Poder de comando que lhe é ínsito, ou seja, o empregador não necessita consultar seu empregado para atribuir-lhe o conteúdo ocupacional do cargo que vai ocupar, isso faz parte do poder de gestão da empresa. Trata-se de autêntico poder diretivo do empregador. Como leciona Amauri Mascaro Nascimento, o poder diretivo é “a faculdade atribuída ao empregador de determinar o modo como a atividade do empregado, em decorrência do contrato de trabalho, deve ser exercida”. [NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Iniciação ao Direito do Trabalho, 34. ed. São Paulo: LTr, 2009. p. 225].

AEPET: Se o poder de comando é uma atribuição de funções do empregador, então quais as razões pelas quais a Petrobrás necessita buscar a adesão de seus empregados para a implantação do PCR?
Uma vez exercido esse poder diretivo e estabelecidas as condições de trabalho, as mesmas somente podem ser alteradas por mútuo consentimento e ainda assim se as alterações não vierem em prejuízo do trabalhador, sob pena de afronta ao disposto no artigo 468 da CLT que dispõe:

Art. 468 - Nos contratos individuais de trabalho só é lícita a alteração das respectivas condições por mútuo consentimento, e ainda assim desde que não resultem, direta ou indiretamente, prejuízos ao empregado, sob pena de nulidade da cláusula infringente desta garantia.

AEPET: O novo PCR poderá trazer prejuízos aos empregados aderentes?

Dr. Vergara: A Petrobrás tem plena ciência de que o novo PCR poderá trazer prejuízos aos empregados aderentes, seja pela alteração da periodicidade das promoções por desempenho, seja pela generalidade do critério de enquadramento que passa a ser por ênfase e não pelo detalhamento do rol de atribuições efetivamente exercidas, seja, ainda, pela criação de uma nova faixa de carreira (master) que poderá favorecer apenas os empregados atualmente enquadrados no alto escalão da companhia em detrimento da massa de trabalhadores enquadrados na categoria júnior cuja mobilidade será mínima. Ciente disso, a Petrobras lança mão de duas medidas que visam a impedir a incidência da norma contida no artigo 468 da CLT em discussões judiciais futuras, quando os prejuízos salariais se concretizarem no tempo: 

a) busca a manifestação de vontade do empregado, sua adesão (com isso preenche o requisito legal do “mútuo consenso”) e;
b) paga um abono PCR, ou seja, uma aparente vantagem econômica, espécie de indenização antecipada em valor presente (com isso preenche o requisito “desde que não resultem, direta ou indiretamente, prejuízos”).

AEPET: Então, porque a Petrobras simplesmente não substituiu o PCAC pelo novo PCR e decidiu manter o PCAC como opção para quem não aderir ao PCR?

Dr. Vergara: Elementar, se não houvesse prejuízo na alteração bastava implantar um novo quadro vantajoso para todos e não precisaria sequer buscar a adesão dos trabalhadores. É verdade que os prejuízos salariais poderão se concretizar aos aderentes ao PCR ao longo do tempo, e tanto isso é verdade que a empresa manterá o PCAC para aqueles empregados que não migrarem.

AEPET: O poder diretivo de empregador da Petrobras está claramente visível na proposta do PCR e na política de concessão de promoções por antiguidade e merecimentos que no PCAC e no PCR proposto em 2018.

A companhia já declarou que “implementará um novo processo de Avanço de Nível e Promoção (ANPR), que só valerá para quem migrar para o PCR. Empregados poderão concorrer na modalidade de avanço de nível em 12 meses por desempenho, cujo percentual de concessão, para o ano de 2018, foi estabelecido em 50% pela Diretoria Executiva, em 28/06”.

Enquanto, “quem permanecer no PCAC poderá concorrer nas modalidades por desempenho, porém o percentual de concessão será de 5% para cada uma das modalidades: avanço de nível em 12 meses, promoção por desempenho e concessão de valor monetário. Ficam mantidas as demais modalidades. A data de vigência deste processo permanece em 1º de julho”.

Em outras palavras, em ambos PCAC e PCR os prejuízos salariais poderão se concretizar no tempo. No PCAC, o número de empregados que obterão avanço de nível em 12 meses será muito menor que o para quem migrar para o PCR em 2018, e poderá permanecer nestes níveis por anos seguidos. Da mesma forma, ninguém também pode garantir que Diretoria Executiva vai manter o mesmo percentual de concessão de avanço de nível em 12 meses nos próximos anos.

Se os prejuízos salariais se concretizarem no tempo, os aderentes ao novo PCR poderão tentar buscar a reparação do prejuízo na justiça?

Dr. Vergara: Depende. Para os danos causados em decorrência da migração de um plano para o outro, não. A matéria resta já pacificada pelo C. Tribunal Superior do Trabalho, através da Súmula 51, II, que dispõe:

Súmula nº 51 do TST
NORMA REGULAMENTAR. VANTAGENS E OPÇÃO PELO NOVO REGULAMENTO. ART. 468 DA CLT (incorporada a Orientação Jurisprudencial nº 163 da SBDI-1) - Res. 129/2005, DJ 20, 22 e 25.04.2005

I - As cláusulas regulamentares, que revoguem ou alterem vantagens deferidas anteriormente, só atingirão os trabalhadores admitidos após a revogação ou alteração do regulamento. (ex-Súmula nº 51 - RA 41/1973, DJ 14.06.1973)

II - Havendo a coexistência de dois regulamentos da empresa, a opção do empregado por um deles tem efeito jurídico de renúncia às regras do sistema do outro. (ex-OJ nº 163 da SBDI-1 - inserida em 26.03.1999)
Isso significa que a opção pelo PCR será irreversível e, portanto, merece muita cautela de parte dos associados.

Vale lembrar os precedentes das empresas Furnas e Docas, julgados pelo TRT do Rio de Janeiro, em situações similares nas quais os empregados se arrependeram de ter aderido aos novos planos propostos pelas empregadoras e depois tentaram buscar a reparação do prejuízo na justiça, sem êxito:

PROCESSO 0010685420145010027
RELATORA TANIA DA SILVA GARCIA
TRT 1ª REGIÃO – RIO DE JANEIRO
DOCAS. Transposição do Plano Único de Cargos e Salários (PUCS) para o Plano de Cargos e Salários (PCES) de 2009.Livre adesão do empregado. A transposição do empregado de um plano de carreira a outro, com estrita observância dos critérios previstos em norma regulamentar, considerando-se como parâmetro apenas o salário-base, não vulnera o princípio da isonomia, com a livre adesão do trabalhador ao novo plano de carreira configurando renúncia ao plano anterior (Súmula nº 51, item II, do TST).

PROCESSO 00168472013501036
RELATOR ANTONIO CESAR COUTINHO DAIHA
TRT 1ª REGIÃO – RIO DE JANEIRO
FURNAS. EMPREGADO QUE FAZ OPÇÃO PELO NOVO PLANO DE CARGOS E SALÁRIOS. Tendo o autor aceitado a proposta de adesão ao novo Plano de Cargos e Salários com todas as suas condições, entre elas a renúncia a direitos oriundos do antigo regime, incabível o pedido de observância das regras estabelecidas no plano anterior. Incide a Súmula 51, II, do C. TST no sentido de que "Havendo a coexistência de dois regulamentos da empresa, a opção do empregado por um deles tem efeito jurídico de renúncia às regras do sistema do outro". Recurso não provido.

Ou seja, o TST já pacificou seu entendimento no sentido de que é válida a opção do empregado por um novo regulamento e que, uma vez que opte pelo novo regramento, estará renunciando aos direitos decorrentes do regulamento anterior.
Somente os danos ocorridos em decorrência da sistemática do novo Plano, a partir de sua vigência, ou seja, que não guardem relação com a migração, é que poderão ser objeto de questionamento judicial futuro (situações novas).

AEPET: E quanto à mobilidade funcional do PCR, isto poderia caracterizar o desvio funcional do empregado no plano de carreira definida no concurso público?

Dr. Vergara: Em situações de desvio funcional ou atribuição indevida de funções em desrespeito ao princípio da impessoalidade, a instituição de apenas 2 cargos com a supressão de cargos criados anteriormente e para os quais foi realizado concurso público é juridicamente questionável sob a ótica da afronta ao artigo 37, II da CFRB 88. Nesse sentido a OJ 125 da SDI do TST que estabelece que mesmo o empregado em desvio de função somente teria direito apenas às diferenças salariais a não a um novo enquadramento, justamente para evitar a burla ao requisito do concurso público para o provimento de novos cargos. (125. DESVIO DE FUNÇÃO. QUADRO DE CARREIRA (alterado em 13.03.2002) O simples desvio funcional do empregado não gera direito a novo enquadramento, mas apenas às diferenças salariais respectivas, mesmo que o desvio de função haja iniciado antes da vigência da CF/1988.).

Fonte: Aepet