Projeto iniciado por Temer e seguido por Bolsonaro desintegra Petrobrás e povo paga o preço na bomba

Brasil à venda

Dois movimentos recentes e significativos da atual gestão da Petrobrás, comandada por seu presidente, Roberto Castello Branco, reforçaram mais uma vez, nas últimas duas semanas, a expectativa dos rumos que a companhia começou a trilhar desde 2016, com a posse de Michel Temer na presidência da República e de Pedro Parente na chefia da estatal.

Em Davos, durante a realização do Fórum Econômico Mundial, o presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Gustavo Montezano, afirmou que a pretendida venda de até 9,86% das ações ordinárias da Petrobrás que o banco detém visa melhorar o resultado primário da União em 2020. O executivo explicou ainda que tal operação faz parte da política de “desinvestimento” do BNDES.

“Com a venda dessas ações, o risco de o Estado brasileiro perder o controle da Petrobrás é muito grande. São ações ordinárias (que dão direito a voto), e não preferenciais, que estão sendo vendidas. Isso pode ameaçar seriamente a capacidade do Brasil de conduzir a Petrobrás, que pode deixar de ser uma empresa pública e virar uma empresa privada, como aconteceu com a BR Distribuidora”, diz José Sergio Gabrielli, ex-presidente da Petrobrás.

O outro movimento da gestão da estatal foi a conclusão, no dia 14 de janeiro, da venda (para a canadense Africa Oil Corp) da participação societária da estatal brasileira na Petrobrás Oil & Gas B.V. (PO&GBV), que produzia petróleo na Nigéria. Com isso, a Petrobras encerrou suas atividades na África.

A Petrobrás na contramão

Para Gabrielli, há duas questões a ser avaliadas quando se fala sobre o que era a Petrobrás até 2002, o que vinha sendo no período dos governos de Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff e as expectativas de seu papel na economia e na sociedade brasileira a partir de 2016.

A primeira questão, diz, é que todas as grandes empresas de petróleo do mundo, privadas ou públicas, buscam integração entre suas atividades, como se formassem uma teia. “Elas querem explorar, produzir e refinar petróleo, transformá-lo em derivados, vender esses derivados e produzir energia. Todas as grandes empresas de petróleo do mundo caminham nessa direção.  Mas a Petrobrás caminha na direção oposta, saindo da integração, tornando-se uma empresa exclusivamente focada na produção do petróleo do pré-sal.”

A segunda questão, na avaliação do ex-presidente da Petrobrás, é que, diferentemente das empresas privadas, as estatais tendem a adotar a estratégia de manter dentro do país a maior parcela possível da renda gerada pelo petróleo. Um dos elementos dessa renda é criar uma cadeia de fornecedores internamente. “No caso da Petrobrás, que trabalha em produção marítima em águas profundas, a ideia deveria ser criar uma indústria naval no Brasil.”

Esse projeto foi desenvolvido. Em 2003, a indústria naval brasileira empregava cerca de 7,5 mil trabalhadores. Dez anos depois, o setor tinha 82 mil postos de trabalho, fora os milhares de empregos indiretos. “A Petrobrás e o governo estão mais uma vez na direção inversa, na contramão ao que está acontecendo no mundo. Tentam fazer com que mais empresas internacionais venham para cá”, aponta Gabrielli.

Antes com atividades integradas, a estatal atuava em uma imensa cadeia em que explorava, produzia e refinava petróleo, transformando-o em derivados, para vender e produzir energia – e divisas para o país.

Assim, o Brasil passa a ser um exportador de óleo bruto e importador de produtos refinados, refém dos preços do mercado internacional. A população não entende por que paga tão caro pela gasolina. “Com a política de preços implantada por Temer em outubro de 2016, a gente vê uma total falta de compreensão da população do porquê dos preços estarem tão altos. Hoje, o litro da gasolina não é inferior a R$ 4,40, em postos confiáveis.

Desintegração

O caso paradigmático da desintegração foi o fato de que a enorme BR Distribuidora, em julho de 2019, passou a ser uma empresa privada, com a venda, pela Petrobras, de 30% de suas ações, por US$ 2,5 bilhões, para 160 investidores de vários países. Até 2017, a Petrobras era detentora de 100% das ações da BR. Naquele ano, sob o governo Michel Temer, a companhia vendeu o primeiro lote das ações. Com o negócio de 2019, já sob Bolsonaro, a Petrobrás ficou com apenas 41,25% da BR Distribuidora e não é mais sua controladora.

A venda de oito importantes refinarias da estatal – o próximo e principal objetivo de “desinvestimento” da gestão – é uma “atrocidade”, junto com a venda da BR. Com isso, a Petrobrás vai abrir mão do sexto maior mercado consumidor de derivados de petróleo do mundo. .

O governo quer vender as refinarias Alberto Pasqualini (RS), Presidente Getúlio Vargas (PR), Gabriel Passos (MG), Landulpho Alves (BA), Abreu e Lima (PE), Isaac Sabá (AM), a fábrica de lubrificantes e derivados Lubnor (CE) e a Unidade de Industrialização de Xisto (PR). O foco da estatal brasileira, como já declarou Castello Branco, é agora apenas o Rio de Janeiro, São Paulo e Espírito Santo.

Se, de 2003 até 2014, a Petrobrás se tornou mais próxima do povo brasileiro, com projetos sociais, esportivos, culturais, educacionais e ambientais, hoje ela caminha no sentido oposto. “A maioria desses programas foi extinto.

Segundo relatório da própria estatal de 2015, os projetos de pesquisa desenvolvidos pelo Centro de Pesquisas e Desenvolvimento Leopoldo Américo Miguez de Mello (Cenpes) receberam, em 2014, US$ 1,1 bilhão, o que fazia da Petrobras uma das maiores empresas investidoras em pesquisa na área de energia no planeta.

Entre 2012 e 2014, o total investido na área de pesquisa e tecnologia chegou a US$ 3,4 bilhões. Em 2014, o Cenpes atuou em parceria com cerca de 100 universidades e centros de pesquisa brasileiros, e 35 no exterior.

Mas a preocupação que a empresa tinha em ajudar no processo de desenvolvimento industrial, econômico e social do país hoje é passado.

Fonte: Rede Brasil Atual