Sob suspeita de Covid-19, gerente embarca na P67 e corta comida dos trabalhadores

Irresponsabilidade com a vida

Em mais um caso absurdo no Sistema Petrobrás de irresponsabilidade com a vida, o geplat (gerente de plataforma) da P67 - unidade da companhia que opera no pré-sal da Bacia de Santos - resolveu de uma só vez colaborar para a propagação do novo coronavírus e negar comida para os trabalhadores. No dia 10 de junho, mesmo após descobrir no Aeroporto de Jacarepaguá que havia viajado de Santos até o Rio de Janeiro ao lado de um trabalhador com teste positivo para Covid-19, ainda assim julgou sensato não cancelar seu próprio embarque. Evidentemente, sendo ele um caso suspeito, o correto era de que os dois não embarcassem, preservando não só suas próprias vidas, mas de todos os trabalhadores a bordo.

Há denúncias ainda de que diversos trabalhadores, submetidos a testes rápidos de pouca precisão e outros até mesmo com resultado positivo, estão sendo embarcados sem qualquer constrangimento, demonstrando não ser apenas uma aventura irresponsável e individual. Repetindo o que ocorre em todas unidades operacionais, o geplat apoia-se na Nota Técnica 28, um protocolo interno que tem forçado o retorno ao trabalho daqueles que testaram positivo a presença dos anticorpos IgM. Uma temeridade, pois este resultado indica, no mínimo, a contaminação por Covid-19 em seu estágio inicial ou em sua fase ativa, quando se está no pico da infecção com possibilidade de transmissão.

A impressão é de que as mais de 50 mil mortes no país não abalam o gerente. Tanto é que, por capricho, ele proibiu os trabalhadores dos regimes de turno de se alimentar no refeitório durante a jornada de trabalho. Com isso, cada um que se vire para enganar a fome com água, bolacha e banana, únicos itens disponíveis nas demais áreas da plataforma. Aos trabalhadores do turno diurno, isso significa uma alimentação precária das 13h às 19 horas, e aos trabalhadores do turno da noite, da meia-noite até 7 horas da manhã. 

Evidentemente, em um regime de confinamento em alto mar, por 21 dias (imposição deste período pandêmico), em turnos diários de 12 horas, numa atividade operacional com alto grau de tensão e bastante esforço físico, não se pode considerar adequado este cardápio reduzido. Não se tratam de pacientes em uma unidade hospitalar, mas de trabalhadores extraindo petróleo do fundo do oceano.

Trata-se de uma postura desumana sem justificativa. Por isso, pouco deveria importar as suas implicações legais, pois vai além do que a Justiça considera ou não adequado. No entanto, diante da dificuldade de sensibilizar racionalmente quem despreza a vida, é importante lembrar que esta medida é ilegal, pois contraria a lei federal 5811/1972. Em seu artigo 3º, é determinado que durante o período em que o empregado permanecer no regime de revezamento em turno de oito horas deve ser assegurado, entre outros direitos, alimentação gratuita, no posto de trabalho, durante o turno em que estiver em serviço.

Os trabalhadores embarcados, conscientes desse direito, imprimiram o que determina a lei e deixaram visível, para qualquer um ler, numa das paredes da sala onde são emitidas as permissões de trabalho. O que fez o geplat? Segundo relatos, arrancou a lei impressa argumentando que ninguém pode colar papel na unidade e, o pior, que a lei não vale na P67. 

Surpreendentemente, ao passar 21 dias confinado em alto mar, o gerente julga não ser um mero gestor, mas sim o dono de uma plataforma sem país, o ditador de uma embarcação sem regras e sem leis, cujos tripulantes são apenas ferramentas necessárias para se produzir e lucrar. Além disso, mais que negligente, no que se refere à irresponsabilidade diante da pandemia, o geplat parece disposto a aplicar sobre os trabalhadores a tática da imunização de rebanho. Afinal, se mata o rebanho e seus elementos mais “fracos”, mas ao menos se livra da pandemia sem afetar os interesses do Deus Mercado. 

É uma lógica perversa. Mas defendida hoje por quem está na cadeira mais importante do país, o presidente Jair Bolsonaro, cuja política vem sendo aplicada por Roberto Castello Branco sem grande peso na consciência. Para quem julgava ser uma caricatura ultrapassada a visão de patrões insensíveis às vidas dos seus trabalhadores, bolsonarismo e sua política da morte diante da Covid-19 mostram a atualidade desta premissa. O desprezo pela dignidade humana não só continua, como agora se manifesta sem pudor.

O Sindipetro Litoral Paulista tomará todas as medidas necessárias para impedir que este gerente aplique, sobre nossa categoria, a política da morte de Bolsonaro. O lucro não pode estar acima da vida!