José Sérgio Gabrielli explica o desmonte da Petrobrás

Desmonte

A Petrobrás está se tornando “uma empresa média ou pequena, exportadora de petróleo cru, voltando ao modelo primário exportador que nós queríamos romper”, é o que afirma o ex-presidente de empresa, José Sérgio Gabrielli.

Veja sua descrição completa do desmonte da empresa.

A queda vertiginosa no preço do petróleo e a grande alta do dólar
“Nós tivemos várias movimentações que levaram ao desmonte da Petrobrás.Eu diria que a primeira grande movimentação não é ligada diretamente a esse fenômeno, mas é o fato de que os preços do petróleo desabam de dezembro de 2014, quando o barril de petróleo estava em torno de 107 dólares. Em julho de 2015, portanto seis meses depois, o barril de petróleo estava 37 dólares. Qualquer empresa, que tenha seu principal produto com uma queda de preço desse tipo, tem problemas. Qualquer empresa. Evidentemente que a Petrobras teve problemas. Se, em cima disso, você coloca uma enorme depreciação do real, que sai de 1,89 reais por dólar para 3,5 reais por dólar ,durante o ano de 2015, e com uma empresa que tem uma dívida essencialmente denominada em dólares, você tem um problema financeiro, porque o custo da dívida cresce e o principal cresce.’

Os reflexos da Lava Jato na aprovação do balanço e na rolagem dos financiamentos
‘Então você tem queda do preço do petróleo, variação cambial pesada e, em cima disso você tem mais um outro problema: com as denúncias da Lava Jato, a Petrobras não consegue aprovar um balanço. A Petrobras passa o ano de 2014 sem balanço porque não consegue aprovar. Os auditores não assinam o balanço da Petrobras.

Consequentemente, a Petrobrás tem um aumento gigantesco do custo da rolagem de sua dívida. Ela perde o investment grade que ela tinha e não consegue rolar sua dívida no curto prazo. Então se você tem dificuldades no caixa, dificuldades na dívida e dificuldades no financiamento, a crise financeira se estabelece.”

O impacto da corrupção no faturamento da Petrobrás
“O balanço da Petrobrás de 2014 reconhece um custo da corrupção, aplicando-se uma taxa de 3% sobre todos os contratos assinados pelos corruptos assumidos da Petrobras, esse custo é, de 2004 a 2014, de 6 bilhões de reais.

Seis bilhões de reais em 10 anos é dinheiro muito grande, não há dúvida que é muito dinheiro. Só que nesses 10 anos a Petrobras faturou 2,6 trilhões de reais. Portanto, seis bilhões sobre 2,6 trilhões é menos do que 0,5% do faturamento da Petrobras.

Mesmo que a corrupção tenha sido muito grande do ponto de vista absoluto, do ponto de vista relativo ela é muito pequena e, portanto, não seria capturável e perceptível pelos sistemas de controle da empresa. Como não foram.

A corrupção, hoje vista como uma coisa gigantesca e muito grande, não foi percebida pela auditoria interna. Não foi percebida pelas auditorias externas. Não foi percebida pelo TCU. Não foi percebida pela Polícia Federal. Não foi percebida pela imprensa. Não foi percebida por ninguém. Como é que se explica? Porque ela era relativamente pequena em relação ao volume de recursos que a Petrobras mobilizava.

Portanto a corrupção não é o elemento principal do ponto de vista de problema financeiro e econômico da Petrobras, não é. O problema era mais econômico, macroeconômico, das condições gerais que levaram à crise de curto prazo da empresa.”

A nova missão da Petrobrás como parte da estratégia de desmonte
“E aí tem uma opção estratégica que foi tomada, infelizmente, inicialmente ainda no governo da presidenta Dilma, mas que foi seguida e acelerada posteriormente com o Temer. Qual é essa posição estratégica? A posição estratégica é tornar um problema financeiro de curto prazo num problema estratégico de longo prazo com a empresa.

A partir de 2014, 2015, a Petrobrás, a empresa de petróleo que está em cima da maior riqueza do mundo de petróleo, que tem um mercado interno gigantesco, porque nós temos hoje o oitavo ou nono maior mercado interno de derivados, que tem o sétimo ou oitavo maior parque de refino do mundo, decide que vai ser uma empresa geradora de dividendos, pagadora de dívida e redutora da alavancagem.

Essa é a missão da Petrobrás. Está definida explicitamente como estratégia da empresa. Ou seja, o foco é o curto prazo, o foco é a geração de caixa, o foco é pagar a dívida. Para você fazer isso em dois anos, como ele pretendiam, e isso está definido como estratégia, inevitavelmente você tem que se desfazer dos ativos que não sejam do chamado core business.

A venda da distribuição, do gás, das termoelétricas, de refinarias etc.
“Portanto você necessariamente leva a um esfacelamento, esquartejamento e destruição daquela empresa que existia. A Petrobrás sai, já saiu, da produção em terra. A Petrobrás já vendeu a sua distribuição. A BR Distribuidora, que tem o nome Petrobrás nos postos, quando você for botar gasolina você não está botando num posto da rede Petrobras, porque a BR não é mais Petrobras, é uma empresa privada que a Petrobras tem uma participação pequena no capital dela. Não tem o controle da Petrobras. Portanto não é uma empresa do sistema Petrobras.

A Petrobras sai do gás de cozinha, vende a Liquigás. A Petrobrás sai dos gasodutos, vende a NTS [Nova Transportadora do Sudeste S/A] vende a TAG [Transportadora Associada de Gás S.A], reduz sua participação no Gasbol [Gasoduto Brasil-Bolívia], diminui o seu contrato de trazer gás da Bolívia para o Brasil e encolhe no gás. Vende a Gaspetro, sai das distribuidoras estaduais, abandona o mercado de gás completamente.

Vende suas termoelétricas, fecha suas plantas de biodiesel, vende ou hiberna suas plantas de fertilizantes e concentra-se, quase que exclusivamente, na produção do pré-sal para exportação de petróleo cru. Anuncia a venda de oito refinarias, da Refap do Rio Grande do Sul à Remam do Amazonas, passando pela Bahia, por Minas Gerais, por Pernambuco e pelo Ceará.”

O retorno ao modelo primário-exportador
“Portanto vai sair e vai ficar com as refinarias de São Paulo e Rio, porque são refinarias extremamente integradas com a produção do pré-sal e vai, portanto, abandonar todas as outras áreas e virar uma empresa média ou pequena exportadora de petróleo cru, voltando ao modelo primário exportador que nós queríamos romper.”

Fonte: Carta Maior