Emanação de gases expõe moradores e omissão de anos da administração do terminal da Transpetro

Em São Sebastião

Obs: As fotos usadas na matéria são meramente exemplificativas

Moradores de bairros próximos ao píer da Transpetro sentiram no dia 06 de novembro (sábado) forte cheiro de gás durante a madrugada. O incidente aconteceu, provavelmente, no momento em que ocorria a operação “ship to ship” (STS - transferência de produtos de navio para navio), entre as embarcações São Luiz e Decathlon, realizada sobre forte emanação de compostos orgânicos voláteis (VOC) para a atmosfera, o que ocasionou inclusive o acionamento do sistema de alarme da casa de controle do píer do terminal da Transpetro.

Enquanto moradores do Centro de São Sebastião e bairros como Vila Amélia, Varadouro, Porto Grande, Praia Deserta, Arrastão e adjacências sentiam o forte odor e acionavam a Cetesb, denunciando o mau cheiro, os operadores do píer alertavam o Coordenador de Turno (Cotur), que é responsável pela operação STS, sobre tais alarmes. Por sua vez, o Cotur ordenou apenas a redução da vazão, sem interromper a operação, contrariando o que recomenda o Guia Internacional de segurança para navios petroleiros e terminais (ISGOTT). A CETESB compareceu ao terminal e também constatou a presença do cheiro no píer.

As irregularidades decorrentes de emanações de gases tóxicos e cancerígenos
O desvio ocorrido no terminal é uma situação recorrente no píer do terminal da Transpetro e tema constante nas reuniões da CIPA e do Grupo de Trabalho do Benzeno (GTB). Pelas normas de segurança do trabalho, irregularidades como essa deveriam servir de alerta e estímulo para a empresa eliminar as causas que levam a tais incidentes, mas o Terminal insiste há anos em expor as pessoas aos riscos desses gases e, em vez de combater o problema, reiteradamente resolve ignorá-lo e continuar arriscando a saúde e a vida das pessoas, tudo para não interromper as operações e cumprir suas metas administrativas que potencializam lucro para os acionistas.

As emanações de vapores orgânicos tóxicos e cancerígenos não vêm apenas dos píeres norte e sul do terminal da Transpetro, mas também de tanques em terra, quando estão recebendo petróleo com ácido sulfídrico, sem contar a Estação de Tratamentos de Efluentes (ETE), que trata água sulfurosa que emana gás sulfídrico, e por fim ainda tem enormes tanques que recebem produtos claros como nafta e gasolina que contêm e emanam gases tóxicos e benzeno - VOC.

A manutenção da operação navio para navio que emanou gases tóxicos e cancerígenos no dia 06/11/2021, além de expor os trabalhadores a uma nuvem desses gases, provavelmente fez com que uma pluma gigantesca desses vapores se formasse sobre o píer, espalhando-se pela cidade lentamente, pois esses gases são relativamente pesados e se alojam em camadas baixas, o que causou o mau cheiro sobre os bairros próximos.

Em nota para a imprensa sobre o ocorrido, a Transpetro disse que “mantém o compromisso com as regiões onde atua, com respeito à segurança, ao meio ambiente e às pessoas”, mas bem sabemos que essas notas são meros arroubos de retórica vazia, pois o único compromisso dos gerentes e cargos de confiança da empresa é com resultados positivos para si e para os acionistas da empresa. Se a administração da Transpetro realmente seguisse os “rigorosos procedimentos de controle operacional” que alega, esse tipo de desvio não aconteceria com tanta frequência como tem sido.

Omissão ao longo dos anos
A equipe de Segurança, Meio Ambiente e Saúde (SMS) do Terminal, responsável pelas medições de gases tóxicos e cancerígenos, já teve um quadro robusto de empregados, porém foi sendo reduzida desde 2015, quando havia 11 trabalhadores, até o exíguo número de quatro, atualmente. Inacreditavelmente, as medições desses gases não são mais efetuadas pelos profissionais de SMS na área operacional, conforme denúncia dos empregados que compõem o GTB, tudo registrado em atas de reuniões. As medições, quando eram realizadas, usavam equipamentos como o ultrarae, que foi literalmente “aposentado” pela empresa que o tirou das recomendações nas Análises de Risco (AR), dessa forma as Permissões de Trabalho (PT) não recomendam mais a necessidade de medição desses gases tóxicos e cancerígenos e não mais mencionam o risco de sua presença. Inclusive, vale destacar que nos padrões de operação da companhia já foram extirpadas menções sobre a presença do VOC e do Benzeno.

No quadro de Técnicos de Operação não é diferente, recentemente em um processo judicial, o Sindipetro-LP conseguiu liminar para manter o efetivo mínimo de 16 operadores por turno, que atualmente tem apenas 10. A liminar até agora não foi cumprida pela empresa. Seria razoável que a companhia aproveitasse essa ordem judicial e retornasse com os quatro operadores nos píeres e acrescentasse o quinto para realizar as operações de STS, que hoje são efetuadas intencionalmente sem a presença dos Técnicos de Operação - provavelmente para não cumprir as normas e potencializar mais os lucros no processo de transferência, submetendo os poucos trabalhadores que restaram e a comunidade local às contaminações sucessivas de gases tóxicos e cancerígenos.

Uma maior quantidade de operadores, que são trabalhadores qualificados para efetuar as operações do terminal, traria mais segurança para a planta e principalmente para os próprios trabalhadores e para a comunidade local, sem contar que aumentaria a eficiência nas operações e a lucratividade para a companhia, evitando aplicações de multas e outros contratempos que vão onerar posteriormente a Transpetro.

Em relação ao Acordo do Benzeno, para esconder definitivamente o perigo da exposição das pessoas a gases tóxicos e cancerígenos, a empresa se recusa a cumpri-lo, uma vez que não quer fazer um padrão específico sobre a identificação e o tratamento desses gases. O padrão que se recusam a fazer é chamado de Trabalhos em Área com Presença de Benzeno e Compostos Orgânicos Voláteis, que está no plano do Programa de Prevenção da Exposição Ocupacional ao Benzeno (PPEOB) há anos, desde 2006.

Além de não elaborar o padrão, que exigiria a implementação de medidas que geram gastos, a empresa não cumpre muitos dos seguintes itens da lista de medidas de monitoramento e controle de gases tóxicos e cancerígenos acordada com o GTB, senão vejamos:

- Elaborar lista de pontos críticos passíveis de exposição, para iniciar o trabalho de ações mitigadoras e/ou procedimentos;

- filmar todo circuito do benzeno com equipamento FLIR, a fim de observar as emissões fugitivas;

- estabelecer a obrigatoriedade da informação do teor de benzeno constar no Certificado de Análise de produtos;

- reavaliar a sistemática de monitoramento nos pontos de medição, intervalos e registro das medições realizadas de VOC e Benzeno durante as cargas e descargas de navios, dentre outros itens.

A companhia insiste em não cumprir o Acordo do Benzeno e ainda dificulta o trabalho do GTB, que vem sendo sufocado pela gestão do Terminal. O sufocamento do GTB e o não cumprimento do acordo do benzeno, como exemplificado nesses itens listados acima, dentre outros também negligenciados, estão levando o controle dessas emissões a um descaso intencional e geral por parte da empresa, que não constrói as barreiras de proteção para os trabalhadores e para a comunidade em torno, que são constantemente contaminados.

Solução
O Sindipetro-LP não quer a interrupção da atividade econômica da Transpetro, mas apenas que ela seja realizada partindo de requisitos normativos mínimos de controle dos riscos à saúde e à vida das pessoas. De maneira resumida, é necessário que a Transpetro retorne com um quadro multifuncional especializado de trabalhadores como era há anos atrás, complementando o efetivo de operadores de acordo com a liminar (16 por turno) e o efetivo de profissionais de SMS (11 técnicos de SMS), bem como, não inviabilizando o trabalho do GTB e cumprindo o Acordo do Benzeno firmado desde 2006. Cumprir o Acordo do Benzeno por meio da lista de metas e prioridades do plano acompanhado pelo GTB é primordial para cessar essa contaminação que vem ocorrendo ao longo dos anos.

É muito importante a participação dos trabalhadores nos registros e na fiscalização do cumprimento das normas acerca do tema, principalmente o trabalho essencial dos membros da CIPA e do GTB, que carregam uma responsabilidade enorme nessas funções, que juntamente com a entidade sindical têm o potencial para construir um ambiente de trabalho saudável e uma planta operacional que não exponha os trabalhadores e a comunidade local a perigos possíveis de serem controlados.

Nesse sentido, o sindicato acompanha o caso e cobrará da empresa uma ação efetiva para que desvios como esse não evoluam para um acidente de maiores proporções, bem como passará a cobrar com mais força a efetivação do Acordo do Benzeno que vem sendo ao longo dos anos sistematicamente negligenciado pela Transpetro. Além disso, o Sindipetro-LP vai manter-se firme na luta jurídica e principalmente na luta política contra a redução abrupta do efetivo do Terminal.