Tragédia completa 37 anos, mas segurança na área industrial continua sendo um problema na Petrobrás

Vila Socó

Há 37 anos, no dia 24 de fevereiro de 1984 um incêndio sem precedentes na história do país atingiu a Vila Socó (hoje Vila São José), em Cubatão. O incêndio foi causado por vazamento de combustíveis de oleodutos que ligavam a Refinaria Presidente Bernardes de Cubatão (RPBC) ao terminal portuário da Alemoa.

Famílias inteiras foram surpreendidas pelas chamas que se alastraram entre as moradias de madeira enquanto muitos já dormiam. O número de mortos (93 corpos encontrados) é até hoje contestado por moradores e entidades formadas a partir do desastre e que representam as famílias, que estimam que mais de 500 pessoas morreram no incêndio.

De acordo com a investigação de órgãos a época, o vazamento ocorreu durante a transferência de combustíveis por uma tubulação que não suportou a sobrepressão, que rompeu o duto, espalhando cerca de 700 mil litros de gasolina pelo mangue.

Relatos da época dizem que alguns moradores armazenaram em suas casas garrafas com gasolina, que acabaram contribuindo para que o incêndio ficasse fora de controle. O produto se espalhou sob as palafitas com a movimentação das marés e cerca de duas horas depois do vazamento, aconteceu a ignição seguida de incêndio. O fogo se alastrou por toda a área alagadiça superficialmente coberta pela gasolina, incendiando as moradias de madeira.

A lembrança do desastre na Vila Socó, por mais que seja dolorosa para as famílias que sobreviveram ao incêndio, serve de alerta para que a segurança na área industrial seja redobrada, nunca descuidada. Não é exagero afirmar que outros acidentes iguais ou maiores do que o da Vila Socó só não aconteceram devido a resposta rápida da operação e do setor de SMS da RPBC.

Infelizmente, vemos um retrocesso na segurança de processo e segurança industrial da Petrobrás, que vem sistematicamente fechando postos de trabalho da operação, da segurança patrimonial e do efetivo de manutenção em todas as suas unidades, acendendo o alerta para possíveis desastres.

No início do mês de fevereiro a gerência da Refinaria Presidente Bernardes (RPBC), em Cubatão, anunciou uma redução no quadro funcional do setor de Segurança, Meio Ambiente e Saúde (SMS) onde estão lotados os técnicos de segurança do turno. A decisão foi pautada, única e exclusivamente, no corte de gastos eleva a refinaria a um patamar alarmante de acidentes que afetam diretamente a segurança da planta e a vida dos trabalhadores.

O problema de baixo efetivo é antigo, mas vem se agravando ano após ano graças à política da alta cúpula da Petrobrás que sempre coloca o lucro acima das vidas. Em 2017, por exemplo, houve redução de 20% do total do quadro mínimo dos operadores do processo produtivo. Após esse período foram realizados sucessivos Programas de Incentivo ao Desligamento Voluntário (PIDVs) e inúmeras aposentadorias sem que houvesse reposição adequada da força de trabalho através de concursos públicos.

Enquanto a gerência da RPBC insiste na versão de que a redução de efetivo não afeta a segurança da refinaria, foi a atuação da operação, em conjunto com os brigadistas do SMS, que impediu em 08 de janeiro de 2016 um Acidente Ampliado com a explosão no parque de esferas em função do vazamento de gás GLP.

No dia 02 de abril de 2015, o incêndio da Ultracargo, no Terminal Alemoa, foi considerado o maior da área industrial do país. Foram 197 horas ininterruptas de trabalho para conter as chamas que atingiam 80 metros de altura e que podiam ser vistas a 15 km de distância. Um quadro aterrador para a região e que virou notícia em rede nacional e no mundo.

Nesse cenário de medo que se instalou uma grande operação de combate às chamas começou. Corpo de Bombeiros, Prefeitura, Defesa Civil, Marinha, Exército e Aeronáutica concentraram suas ações para que um desastre maior não acontecesse.

Outra equipe que foi determinante no processo de combate ao incêndio foram os Brigadistas da RPBC e da Transpetro. A corporação esteve desde o primeiro instante se revezando para combater o incêndio. Eles utilizaram todo o conhecimento que têm e mostraram o quanto são preparados para qualquer tipo de situação. A RPBC também ajudou de outra forma, fornecendo Liquido Gerador de Espuma (LGE) e equipamentos.

A Unidade de Tratamento de Gás Monteiro Lobato (UTGCA), em Caraguatatuba, vem sofrendo, a cada dia, com a redução drástica do efetivo operacional. A situação é grave e mesmo assim, a unidade segue sem qualquer planejamento de efetivo. Isso é uma clara violação às disposições previstas na NR-20 no que diz respeito à segurança do processo.

Há um déficit no quadro operacional pelos mais variados motivos, que vão desde os desligamentos via aposentadoria e PIDV; afastamentos diversos, seja pela necessidade de quarentena, seja por outros motivos relacionados à saúde, até transferências de trabalhadores para outras unidades da empresa, sem permuta, ocasionando uma vacância nos grupos de operadores.

Os terminais da Alemoa e Pilões não passam ilesos e vêm operando com riscos, pois a política de redução do efetivo também já chegou nessas unidades.

Acidentes de Trabalho

A Organização Internacional do Trabalho (OIT) colocou o Brasil em 4º lugar no terrível ranking dos acidentes de trabalho. O país fica atrás somente da China e dos Estados Unidos. Segundo estatísticas da Previdência Social, o país registra mais de 700 mil casos de acidentes de trabalho por ano. Esses números não englobam os trabalhadores terceirizados já que estes não aparecem no momento da concessão do benefício. A definição legal de acidente de trabalho se restringe às ocorrências que envolvem os segurados do Regime Geral de Previdência Social. Para termos ideia da disparidade, em 2018 foram subnotificados 154,2 mil acidentes sem emissão de Comunicação de Acidente de Trabalho (CAT).

Em um levantamento feito pelo Observatório Digital de Segurança e Saúde do Trabalho, morre um trabalhador a cada 3h40min em acidentes. O cenário é triste, alarmante e demonstra que existe uma necessidade urgente de que as empresas compreendam que os valores aplicados em proteção e segurança são investimentos e não gastos como a Petrobrás vêm preconizando ao longo dos anos.

No mundo, de acordo com as estatísticas da OIT, a cada 15 segundos, morre um trabalhador vítima de acidente de trabalho ou de doença relacionada à atividade laboral. Isso significa um total de 6300 mortes por dia e 2.3 milhões de mortes por ano. Além disso, 313 milhões de trabalhadores e trabalhadoras sofrem lesões profissionais não fatais todos os anos perfazendo um total de 860.000 pessoas feridas no trabalho todos os dias.

Segurança do trabalho é uma ciência que analisa fatores de risco e causas de acidentes, durante o exercício do trabalhador. Além disso, também define medidas de prevenção no ambiente de trabalho. De acordo com a Portaria Nº 25/1994, os riscos ambientais ocupacionais se classificam em 5 grupos. Essa definição é feita de acordo com a sua natureza: físicos, químicos, biológicos, ergonômicos e acidentes.

Atualmente, o Brasil tem 37 NRs e, mesmo assim, os números de acidentados e mortos é alto. As principais causas, segundo a Organização Internacional de Trabalho (OIT), é o descumprimento de normas básicas de proteção e más condições nos ambientes e processos de trabalho. Se com essa regulação os números são chocantes não é de se admirar que os dados se multipliquem de forma exponencial. A situação está tão séria que, em 2019, o Brasil entrou na lista dos dez piores países do mundo para trabalhar, de acordo com o Índice Global de Direitos da Confederação Sindical Internacional (CSI). Os motivos determinantes foram adoção de leis regressivas, repressão violenta de greves e ameaças e intimidação de líderes sindicais.

Para que as ações de segurança sejam empregadas no Sistema Petrobrás é preciso que o trabalhador exija abertura da Comunicação Acidente do Trabalho (CAT) em caso de acidentes ou doenças relacionadas ao trabalho (o covid-19 é uma delas). Dessa forma é possível empenhar uma investigação mais rigorosa do que levou à abertura da CAT e exigir reparação dos desvios que causam riscos nas unidades.

Toda forma de perigo grave e iminente com riscos que possam trazer qualquer tipo de acidente do trabalho, deve ser denunciada. O Sindipetro-LP tem diversos canais de denúncias, sendo uma delas o contato direto com os diretores de base e dos liberados, que estão em permanente contato com a categoria. Para contatá-los, acesse o link com os números de seus celulares aqui. Denuncie!

Com informações da Fundacentro, Brasil de Fato, G1, OIT-Lisboa e Diário de Pernambuco