Em artigo, Siqueira chama balanço da Petrobrás de baixaria contábil

Opinião

Por Fernando Siqueira

Em março, a direção da Petrobras realizou uma baixa contábil nos ativos da companhia, que surpreendeu a todos nós, inclusive ao mercado. Ocorre que a companhia, que teve um lucro de R$ 13,6 bilhões em 2015, acabou apresentando déficit de R$ 34 bilhões.

Isto porque essa baixa, meramente contábil, atingiu o incrível valor de R$ 47,67 bilhões. O presidente Bendine, que pensa de forma puramente financista, não se preocupou com a importância estratégica e o respectivo desgaste da imagem da empresa.

Ora, estamos convivendo com o projeto do senador José Serra, já aprovado no Senado e tramitando na Câmara, que retira da Petrobras a condição de operadora única e facilita a entrega do pré-sal para companhias estrangeiras.

Um rombo contábil dessa ordem, ademais fictício, ajuda a derrubar o prestígio da empresa já tão abalado pela Lava-Jato, facilitando a vida dos que são favoráveis aos leilões que acabarão nas mãos do cartel internacional do petróleo.

Que o presidente Bendine queira evitar desembolso com dividendos e participação nos lucros é até compreensível visto que o caixa está muito baixo e o acesso ao crédito requer muito trabalho. E isto acaba dificultando os investimentos, cujo retorno é alto, mas demandam altos recursos.

O que não é aceitável é uma baixa feita sob critérios discutíveis, como, por exemplo:

1) baixar as reservas de petróleo da Petrobras para 13,28 bilhões de barris. Ora, só o campo de Franco, que ela adquiriu na cessão onerosa, tem reserva estimada de 10 bilhões. Juntando os campos já descobertos de Tupi, Iara, Carcará, parte de Libra, das Baleias e outros áreas, com os campos do pós-sal e os de terra, são mais de 30 bilhões de barris;

2) o Comperj foi considerado como zero porque as obras estão paradas, mas o Comperj tem 84% de sua obra concluída. O que se exigiria é a continuidade da sua construção, fundamental para processar produtos do pré-sal, e não essa baixa esdrúxula;

3) o preço baixo do petróleo é considerado como de curta duração, uma questão geopolítica, por especialistas do ramo, mas Bendine considerou-o de longa duração;

4) ele depreciou ainda diversos ativos sem considerar que o preço do petróleo voltará a crescer e esses ativos vão retomar os seus valores;

5) o raciocínio foi: se vender esses ativos agora, o preço a ser conseguido é o desvalorizado. Ademais, vender ativos neste momento é totalmente insensato, podendo caracterizar uma gestão temerária.

Ainda mais suspeito é que Dilma e Lula, que eram contra, passaram a defender o projeto a partir de uma emenda “esperta” do senador Romero Jucá, que dá uma falsa ideia de melhoria.

A emenda diz que o CNPE poderá entregar um campo do pré-sal à Petrobras. Ora quando Dilma entregou Libra, a Lei 12351/2010 dizia tacitamente que área estratégica — caso de Libra — será entregue à Petrobras. Não foi obedecida.

Imagine-se agora num governo PMDB/PSDB. Lá se vai o pré-sal, a maior das riquezas, e a baixa contábil se transforma numa “baixaria” contábil.

Fonte: O Globo