Uma tragédia e muitas lições: 35 anos do incêndio da Vila Socó

Jamais esqueceremos

Há 35 anos, no dia 24 de fevereiro de 1984 um incêndio sem precedentes na história do país atingiu a Vila Socó (hoje Vila São José), em Cubatão. O incêndio foi causado por vazamento de combustíveis de oleodutos que ligavam a Refinaria Presidente Bernardes de Cubatão (RPBC) ao terminal portuário da Alemoa.

Famílias inteiras foram surpreendidas pelas chamas que se alastraram entre as moradias de madeira enquanto muitos já dormiam. O número de mortos (93 corpos encontrados) é até hoje contestado por moradores e entidades formadas a partir do desastre e que representam as famílias, que estimam que mais de 500 pessoas morreram no incêndio.

De acordo com a investigação de órgãos a época, o vazamento ocorreu durante a transferência de combustíveis por uma tubulação que não suportou a sobrepressão, que rompeu o duto, espalhando cerca de 700 mil litros de gasolina pelo mangue.

Relatos da época dizem que alguns moradores armazenaram em suas casas garrafas com gasolina, que acabaram contribuindo para que o incêndio ficasse fora de controle. O produto se espalhou sob as palafitas com a movimentação das marés e cerca de duas horas depois do vazamento, aconteceu a ignição seguida de incêndio. O fogo se alastrou por toda a área alagadiça superficialmente coberta pela gasolina, incendiando as moradias de madeira.

A lembrança do desastre na Vila Socó, por mais que seja dolorosa para as famílias que sobreviveram ao incêndio, serve de alerta para que a segurança na área industrial seja redobrada, nunca descuidada. Não é exagero afirmar que outros acidentes iguais ou maiores do que o da Vila Socó só não aconteceram devido a resposta rápida da operação e do setor de SMS da RPBC.

Infelizmente, vemos um retrocesso na segurança de processo e segurança industrial da Petrobrás, que vem sistematicamente fechando postos de trabalho da operação, da segurança patrimonial e do efetivo de manutenção em todas as suas unidades, acendendo o alerta para possíveis desastres.

Em 2017 a RPBC implantou uma redução de 20% do efetivo operacional, a mesma equipe que geralmente é responsável pelo primeiro combate nos eventos e que controla os riscos quando há acidentes. Da mesma forma, os terminais da Alemoa, Pilões e São Sebastião vêm operando com riscos, pois a política de redução do efetivo também já chegou nessas unidades.

Enquanto a gerência da RPBC insiste na versão de que a redução de efetivo não afeta a segurança da refinaria, foi a atuação da operação, em conjunto com os brigadistas do SMS, que impediu em 08 de janeiro de 2016 um Acidente Ampliado com a explosão no parque de esferas em função do vazamento de gás GLP.

Brumadinho, Mariana e Paulínia guardam tragédias provocadas por falta de investimento em segurança 
De acordo com o Ministério Público do Trabalho, o Brasil ocupa o quarto lugar do ranking mundial para acidentes de trabalho atrás da China, Índia e Indonésia. hoje o país contabiliza a cada 48 segundos um novo acidente de trabalho e a cada 3h38 um trabalhador perde a vida pela falta de uma cultura de prevenção à saúde e à segurança do trabalho.

O rompimento de barragem em Brumadinho que ocorreu em 25 de janeiro, entrará para a história negativa sendo o maior acidente de trabalho já registrado devido ao grande número de óbitos de trabalhadores da Vale e dos contratados, além de vítimas da comunidade que não são contabilizados diretamente. Até o momento, 179 mortes estão confirmadas e 131 pessoas continuam desaparecidas.

Antes da tragédia de Brumadinho, O maior acidente de trabalho que havia na história do Brasil, ocorreu no dia 4 fevereiro de 1971, quando o teto de um pavilhão de exposições projetado por Oscar Niemeyer desabou, matando 69 pessoas e ferindo mais de cem. Segundo os especialistas, o acidente ocorreu porque o então governador de Minas Gerais, Israel Pinheiro, queria inaugurar a obra antes do fim de seu mandato. O gestor ignorou os alertas de que o cimento ainda não tinha maturado e ordenou que fossem retiradas as escoras de sustentação da estrutura. Cerca de 10 toneladas de concreto armado desabaram por volta das 11h45, e até hoje há famílias sem indenização.

A terceira maior tragédia do tipo aconteceu em Paulínia (interior de SP), na Shell-Basf. Ao longo de muitos anos de funcionamento (que começou em 1977), os agrotóxicos usados pela Shell contaminaram o solo e acabaram matando 62 funcionários. Mais de mil funcionários também foram afetados.

A quarta foi a tragédia em Mariana (MG), em 2015, que também teve envolvimento da Vale – ela é, ao lado da anglo-australiana BHP, dona da Samarco, responsável pela barragem que se rompeu ali. A tragédia arrasou a região, contaminou os rios e deixou 19 mortos.

O diretor de Saúde e Segurança do Sindipetro LP, Marcelo Juvenal Vasco, que ocupa a mesma pasta na FNP- Federação Nacional dos Petroleiros, alerta que estamos passando por um momento de fraqueza industrial diante do capitalismo que busca o lucro acima das próprias vidas. “Os gestores dos dias atuais estão sendo formados para se preocuparem apenas com os números que serão apresentado na Bolsa de Valores, ignorando o número crescente como novo beneficiário do INSS”, afirma Juvenal.

O Sindipetro-LP hoje empenha o papel de lutar contra a redução do efetivo e por condições de maior segurança na Petrobrás, mas o sindicato sozinho não conseguirá sensibilizar as autoridades sobre a importância de cada posto de trabalho existente no sistema Petrobrás, os trabalhadores precisam estar juntos nessa luta.

Aos familiares das vítimas do incêndio na Vila Socó, nossos sentimentos e a certeza de que lutaremos para que tragédias como essa nunca mais aconteçam.