A esquizofrenia de A Tribuna: celebra o desmonte da Petrobrás e depois se queixa

Editorial

No último dia 6 de janeiro, o jornal A Tribuna – periódico impresso de maior circulação da Baixada Santista – publicou editorial no qual comemora a destruição em curso da Petrobrás para depois, de maneira um tanto estranha e esquizofrênica, criticar no mesmo artigo justamente aquilo que elogiou.

Sob o título “Petrobras em 2020”, os proprietários do veículo celebram o enxugamento da companhia, opinando que “é correta a preocupação demonstrada pela Petrobras na busca da eficiência máxima e de resultados operacionais satisfatórios, valendo-se de sua experiência, como é o caso da sua capacidade para explorar campos off shore”.

Em outras palavras, A Tribuna considera um acerto a política privatista da atual gestão, que inclui a venda a preço de banana de diversos ativos para a iniciativa privada. Parte deles, o próprio jornal lista no editorial: “O atual plano prevê a saída da Petrobras de campos maduros em terra e águas rasas, bem como da petroquímica Brasken e das atividades de transporte e distribuição de gás natural e da produção de biocombustíveis e fertilizantes. Além disso, a estatal pretende reduzir sua participação no setor de refino de petróleo”.

A primeira observação importante se refere à cegueira dos proprietários do jornal sobre a realidade que os cerca. Todas as unidades da Petrobrás na Baixada Santista reduziram, em média, pela metade o seu quadro de empregados próprios e indiretos. Como se não bastasse, aqueles que permaneceram empregados, sobretudo os terceirizados, hoje sofrem com reduções salariais de até 50%, perda de benefícios, calotes e precarização profunda das condições de trabalho. É essa tragédia social que o jornal celebra. Aliás, a própria A Tribuna, em reportagem publicada nesta terça-feira (7), aponta que a arrecadação de royalties na região tende a cair em cinco anos. Portanto, o impacto social e econômico do encolhimento da Petrobrás em suas demais áreas, como refino e área de negócios, pode ser ainda mais grave do que se imaginava. Por que A Tribuna ignora isso?

Porém, o que chama atenção é quando o editorial decide tecer uma única crítica ao atual plano da Petrobrás. Segundo o jornal, “o foco excessivo nas atividades de exploração e produção de petróleo, que irão consumir 85% dos investimentos previstos entre 2020-2024, causa, entretanto, preocupação. Em todo o mundo, grandes petroleiras têm se transformado em empresas de energia, investindo em fontes renováveis, como a eólica e a solar, e a Petrobras se mantém ainda distante dessa realidade”.

Ora, o editorial cai em contradição, pois é justamente a política que ele elogia a responsável pelo desmonte da Petrobrás como uma empresa de energia, integrada do poço ao posto, com capacidade não apenas para produção de energias renováveis, mas para contribuir com o país a sair da crise gerando emprego e barateando os preços dos derivados do petróleo, como a gasolina, o diesel e o gás de cozinha.

A alta no preço da gasolina, o gás de cozinha mais caro, os alimentos também pesando no orçamento familiar com o valor do transporte mais oneroso, tudo isso é consequência do enxugamento da empresa. E, principalmente, da política de paridade dos preços dos combustíveis com o mercado internacional.

Não se trata de uma obrigação, mas sim de uma escolha política do governo Bolsonaro para favorecer acionistas privados da empresa e petrolíferas internacionais. Com a política de paridade, a cada nova subida no valor do barril aumenta o seu lucro. E quanto maior o lucro, maior a transferência de dinheiro aos acionistas que vivem da especulação financeira e pilhagem do patrimônio alheio.

Entretanto, com produção recorde de petróleo e parque de refino robusto, hoje ameaçado com a venda de metade de suas refinarias, a Petrobrás teria totais condições de suspender essa política, garantindo assim à população preços populares para os combustíveis e gás de cozinha.

A despeito da insistência em ressaltar a dívida da empresa, ela vem apresentando lucros formidáveis e recordes de produção de petróleo. Pouco importa se isso é conquistado à custa do sofrimento dos brasileiros e até mesmo a partir de conflitos internacionais graves, como ocorre atualmente com as tensões entre EUA e Irã. De quebra, essa política favorece as petrolíferas internacionais, pois refinando menos e acompanhando os preços internacionais, facilita a entrada de concorrência estrangeira com a importação de derivados.

A impressão é de que o completo desprezo do jornal sobre o tema, e sobre os efeitos dessa política ao maior acionista da Petrobrás, a população brasileira, foi preenchido com a histórica simpatia do veículo à privatização e desmonte de tudo o que é público. Sem exceção, em troca de migalhas, a elite que comanda os grandes jornais do país atua como representante do Deus Mercado. Com a família Santini não seria diferente.