Sem resistência, futuro do Edisa Valongo é fechar as portas com demissões em massa

Desmonte e privatização

Em reportagem publicada na edição desta sexta-feira (22), o jornal A Tribuna publicou matéria de página inteira, sob o título ‘Petrobras transfere empregados ao Rio’, que repercute o histórico de medidas da alta administração da companhia que sinalizam o abandono das instalações e investimentos no estado de São Paulo. Na reportagem abaixo, o Sindipetro Litoral Paulista expressa o seu posicionamento sobre o tema e lista um extenso histórico de medidas que comprovam o esvaziamento promovido pela empresa no estado e também em Santos, no Edifício Valongo.

Em dolorosas parcelas, a direção da Petrobrás está reduzindo a presença da empresa no estado de São Paulo, extinguindo postos de trabalho terceirizados e transferindo mão de obra direta para o Rio de Janeiro. Perdem os trabalhadores, engrossando o batalhão de desempregados do país, que superam os 12 milhões pelos dados oficiais, e perde toda população paulista, com a fuga de investimentos da estatal e consequente queda na arrecadação de tributos e outras receitas.

Na cidade de Santos, as medidas adotadas apontam para um esvaziamento paulatino de suas atividades no Edifício Valongo. O prédio é uma espécie de QG das operações de exploração e produção de gás e petróleo das plataformas da Bacia de Santos, mas seu papel estratégico vem sendo ameaçado. Uma medida recente que ilustra essa tendência é a transferência da representação sindical de 937 trabalhadores para o Rio de Janeiro.

Anunciada no dia 11 de maio, a mudança atinge petroleiros lotados no Edisa Valongo que atuam, sob regime especial, em sete plataformas da base territorial do litoral paulista. Segundo o Sindipetro-LP, que considera a alteração ilegal, a mudança tem dois objetivos. O primeiro deles, econômico, tirar da companhia a responsabilidade pelos custos relacionados ao transporte desses empregados. E o segundo, político, desarticular a organização sindical da categoria.

O Sindicato lembra que a decisão aprofunda os impactos negativos de uma medida tomada dois anos atrás, sob a gestão de Pedro Parente. Em abril de 2018, a empresa eliminou os voos das plataformas de Merluza e Mexilhão pelo Aeroporto de Itanhaém, transferindo todos eles para Jacarepaguá, no Rio de Janeiro. Com isso, 30 postos de trabalho foram extintos e a economia local foi impactada, prejudicando taxistas, donos de hotéis e restaurantes. Apesar de jogar fora R$ 14 milhões investidos poucos anos antes em melhorias no aeroporto, a decisão foi justificada pela necessidade de reduzir custos.

Pouco mais de um ano depois, uma nova medida confirmaria a preferência da empresa por concentrar as atividades no Rio. Em outubro de 2019, sem negociação com o Sindicato, a empresa anunciou que 74 empregados do Valongo seriam transferidos para a capital fluminense. Destes, 37 já foram obrigados a se mudar e outros 37 seguem em Santos. A desestruturação da vida de dezenas de famílias, mais uma vez, foi justificada pela “necessária" redução de custos. Um ano antes, no setor de Poços, sete engenheiros foram deslocados para Macaé (RJ).

Numa consequência direta desta política, na última semana a ProTec - empresa terceirizada que atuava no Edifício Valongo com segurança do trabalho - não teve o contrato renovado. Com isso, cinco postos de trabalho foram extintos. E fortalecendo o encolhimento e concentração da área administrativa da empresa no Rio, a direção da Petrobrás se aproveita da pandemia para defender o home office como condição permanente de trabalho para ao menos 50% desse setor da categoria, como declarou em entrevista recente o presidente da companhia, Roberto Castello Branco.

Isso lhe permite, de uma só vez, pôr em prática dois objetivos: de um lado reduzir custos, ao esvaziar prédios administrativos espalhados pelo país, e de outro fragilizar a organização sindical da categoria, afinal os trabalhadores estarão submetidos a uma condição de isolamento permanente, perdendo qualquer contato com a coletividade. No que se refere à economia conquistada com o home office, já temos no Valongo resultados práticos: Telsan (engenharia) e Topservice (manutenção e limpeza) promoveram demissões nos últimos dias. E tudo indica que outras terceirizadas seguirão o mesmo caminho.

“Temos lotados no Valongo 1.861 trabalhadores próprios e praticamente o mesmo número de terceirizados, o que totaliza quase 4 mil pessoas. Mas se depender da atual direção, esse número cairá. Uma gestão que não protege os trabalhadores na maior crise sanitária que já enfrentou, entregando máscaras de péssima qualidade e forçando a continuidade de atividades não essenciais, não hesitará em desativar o Valongo se houver espaço para isso. Irá sim fechar o prédio, encerrar os contratos com as terceirizadas e transferir os empregados próprios para o Rio. Este é o plano que vem se desenhando”, denuncia Fábio Mello, diretor de comunicação do Sindipetro-LP.


Para Adaedson Costa, coordenador-geral do Sindipetro-LP e secretário-geral da Federação Nacional dos Petroleiros (FNP), o desmonte dos negócios da companhia no estado de São Paulo é evidente. “Quando juntamos os fatos e percebemos o quanto estão articulados, não restam dúvidas do que se está em curso. Mas sua execução parcelada tem um objetivo: blindar a gestão da empresa da reação negativa da opinião pública e tentar evitar uma resposta organizada da categoria. Se essas medidas fossem tomadas de uma só vez cairia como uma bomba para a sociedade”.

Quase um ano atrás, em uma palestra organizada pela BTG Pactual, em agosto de 2019, Salim Mattar já dava razão à opinião de Adaedson Costa. Na ocasião, o secretário especial de Desestatizações, Desinvestimentos e Mercados do Ministério da Economia, deu a pista sobre a estratégia do governo Bolsonaro para as privatizações: "Se você fizer muito barulho é pior. Então, tem que trabalhar mais em off”.

Edisp, um estudo de caso

Apesar de dramático, o prognóstico do Sindipetro-LP é consistente. Além das medidas já apontadas, que sinalizam uma tendência de esvaziamento do Valongo, há um caso concreto recente que serve de exemplo: a desativação da sede administrativa da companhia, na Av. Paulista, o Edisp. Em fevereiro de 2019, a direção da Petrobrás - já sob o comando do bolsonarista Roberto Castello Branco - anunciou a desocupação do prédio.

Em reunião com os trabalhadores logo após o anúncio repentino, o gerente executivo de Gestão de Pessoas, Cláudio Costa, abordou o tema sem meias palavras. A fala foi gravada, o áudio vazado e a revolta foi imediata. Em determinado trecho, ele avisou: “Dá pra absorver todo mundo? Não, não dá. Algumas pessoas não ficarão na companhia. Dá pra absorver todo mundo que aqui está? Não, algumas pessoas não ficarão. Algumas vão poder decidir por escolha própria não permanecer na companhia, os programas virão aqui para ajudá-los nesse processo decisório. O que a gente precisa ter em mente aqui é: ficará em São Paulo aquilo que é essencial”.

Cibele Vieira, diretora do Sindipetro Unificado, relembra o percurso traçado desde a gestão Pedro Parente, em 2016, até Castello Branco, em 2019, quando o prédio foi desativado. “A grande mudança foi quando o setor de Bens e Serviços, a atividade-chefe do prédio, passou a ser desmontada em 2016. No início, as transferências seriam realizadas para o Rio, mas após muita pressão conseguimos realocar os trabalhadores para unidades do estado de São Paulo. Na época, fizemos atos, denunciamos as medidas e avisamos que o projeto era fazer isso com o prédio inteiro. Para alguns soou como alarmismo, exagero. Os fatos, infelizmente, nos deram razão”.

Com o fechamento da unidade consolidada, novamente a luta do Sindipetro Unificado foi para garantir a permanência dos trabalhadores no estado. Após pressionar a empresa, a maior parte foi realocada para as refinarias do estado e, inclusive, para o Valongo. Fábio Santos, diretor do Sindipetro-LP, comenta que a chegada desses trabalhadores coincidiu com a suspensão, temporária, da transferência de parte do setor de Contabilidade e Tributário (Contrib) para o Rio. “Algumas transferências acabaram sendo efetivadas em 2017, mas em quantidade menor que a planejada pela empresa. Acreditamos que a transferência dos remanescentes do Edisp para o Valongo ao longo de 2018 e parte de 2019, no mínimo, retardou esse processo. Agora, é de se esperar que a empresa tente retomá-lo. De qualquer forma, demonstra que a tentativa de concentrar as atividades no Rio é antiga”.

Em relação aos terceirizados, sempre a corda mais fraca, Cibele comenta que a companhia simplesmente não renovou os contratos, deixando a força de trabalho indireta à própria sorte. Antes das medidas implantadas via desinvestimento, o Edisp chegou a ter mil trabalhadores próprios. Hoje, restam no novo edifício, na Rua Augusta, cerca de 180. “Há um simbolismo na extinção do Edisp. Era um marco muito grande da presença da Petrobrás em São Paulo. Hoje, sua saída para um prédio desconhecido ilustra o caminho escolhido pela atual direção, que é sim desmontar investimentos no nosso estado”.

Articulação estadual para barrar o desmonte

Para que o Valongo confirme sua vocação, que é gerenciar a riqueza descoberta na camada do pré-sal, o Sindicato defende uma grande articulação estadual. “Esse tema não pode ser uma preocupação só nossa. Porque afeta os trabalhadores diretos, terceirizados e suas famílias, mas também toda a economia. Precisamos do apoio da sociedade e de uma resposta efetiva das autoridades públicas. Sem isso, barrar esse desmonte será uma tarefa muito mais difícil. Vereadores, prefeitos e governador não podem se omitir”, defende Mello.

Embora não haja ainda estudos sobre os impactos da redução das atividades da Petrobrás no estado de São Paulo, o que viveu o Rio Grande do Norte serve de alerta. Após a venda e desmobilização de ativos, com o fim da exploração de petróleo em terras potiguares, os investimentos caíram R$ 931,7 milhões (63,03%), entre 2012 e 2018.

Para Adaedson, mais que uma reorientação de negócios, a política da atual direção tem razões ideológicas. “Meses antes de assumir a presidência da empresa, Castello Branco publicou um artigo na Folha defendendo a sua privatização. Já no comando da empresa, reafirmou que seu sonho é vendê-la. É o típico caso da raposa cuidando do galinheiro. E assim como abandona São Paulo de maneira parcelada, tenta privatizar a empresa aos poucos, fatiando o seu patrimônio, retirando direitos, promovendo demissões. Sem grande alarde, de maneira dissimulada, tenta transformar seu sonho em realidade”.

Para Fábio Mello não é por acaso que, por várias vezes, Castello Branco defendeu a Petrobrás como uma empresa do Rio de Janeiro. Para ele, trata-se de uma falsificação da história. “A Petrobrás foi criada a partir de um movimento popular nacionalista, na década de 1950. Desde então, cresceu e se espalhou por todas as regiões do país, das áreas mais urbanas às mais remotas e rurais, pois se trata de uma empresa genuinamente brasileira, com compromissos históricos com seu país. No fundo, o que Castello Branco quer é transformar esse patrimônio nacional numa cópia das empresas privadas, que exploram seus trabalhadores, reduzem direitos e entregam todo o lucro aos acionistas privados”. E completa. "É um bajulador do Deus-Mercado, que coloca à venda oito refinarias, metade do seu parque de refino, para “estimular" a concorrência! Isso só se explica por motivações ideológicas, por entreguismo, submissão aos interesses privados. É contra essa política criminosa que estamos lutando”.