Bolsonaro usa artimanha neoliberal para jogar população contra Petrobrás para privatizá-la

Por Fernando Siqueira

Preços absurdos transferem recursos dos brasileiros para acionistas privados, maioria estrangeiros

Nos três artigos anteriores, eu comentei a manipulação das estruturas de preços dos combustíveis com seríssimo prejuízo para o povo brasileiro, que paga muito caro e sofre uma perniciosa inflação decorrente disto. Vou mostrar os fatos e dados que são as causas dessa absurda manipulação:

1) Em 1977, o secretário de Estado americano Henri Kissinger declarou: "Os países hegemônicos não podem mais viver da maneira atual, sem acesso às fontes de energia não renováveis do planeta. Para tanto, terão que montar um esquema de pressões e constrangimentos para atingir seus objetivos".

Em 1986, em Punta Del Leste, decorreu a rodada Uruguai do GATT (sigla em inglês que significa Acordo Geral de Tarifas e Comércio) de onde saíram várias diretrizes neoliberais, com ênfase para a América Latina.

Em 1989, decorreu o Consenso de Washington em que os dirigentes desses países foram convocados aos Estados Unidos e pressionados a implementar medidas como, mudanças de suas legislações (incluindo as constituições – desregulamentação); privatarias; proteção às patentes – TRIPS (propriedades intelectuais). Os países hegemônicos – maiores geradores de patentes – sendo os mais beneficiados; proteção aos investidores (esta diretriz gerou a absurda proposta do AMI – Acordo Multilateral de investimento – a ser mostrado em outro artigo).

A Rodada terminou em 1995, em Marrakesh, no Marrocos, com a criação da OMC (Organização Mundial do Comércio), outro braço dos Estados Unidos.

Fernando Henrique foi nomeado pelo presidente Itamar Franco ministro das Relações Exteriores e passou alguns meses nos Estados Unidos. Na volta foi escolhido para ser o presidente do Brasil – "com a cabeça feita".

Eleito presidente, sua primeira iniciativa foi mudar capítulo 5 da Constituição de 1988 (Ordem Econômica) em que acabou com os monopólios do petróleo, do gás canalizado, das telecomunicações e da navegação de cabotagem. Permitindo que embarcações estrangeiras navegassem nos rios brasileiros para escoar as nossas riquezas, já que também abriu o subsolo do Brasil para as multinacionais. Vendeu a Vale e a Telebrás por preços irrisórios.

2) No 2º Fórum Social Mundial, de 2002, a socióloga mexicana, Ana Ester Ceceña publicou o artigo: "Estratégia de Dominação e Mapas da Construção da Hegemonia Mundial".

Nesse artigo ela revela as cinco estratégias do Departamento de Defesa norte-americano, descobertas por um patrício seu e que são: 1) Proteger a soberania, o território e a população dos Estados Unidos; 2) Evitar que países potencialmente hegemônicos se desenvolvam e coalizões hostis; 3) Assegurar acesso incondicional às fontes de energia; 4) Dissuadir e derrotar qualquer agressão contra os Estados Unidos e seus aliados; 5) Garantir a liberdade dos mares, vias de tráfego aéreo e espacial e segurança das linhas de comunicação.

As estratégias 2 e 3 afetam diretamente o Brasil e o Mercosul, e que eles tentam desmontar desde a sua criação. O Brasil por suas riquezas minerais e biodiversidade, clima tropical altamente favorável a plantio durante todo o ano e a geração de energias solar, eólica e biomassa; detentor de uma imensa reserva de água doce (Rio Amazonas, Aquíferos Guarani e Alter do Chão e muitas outras) é um dos países mais ricos e viáveis do planeta. Podendo se tornar um país hegemônico. É o alvo principal.

Considerando que a Noruega saiu da condição de segundo país mais pobre da Europa para o de país mais desenvolvido do mundo, tendo o melhor Índice de Desenvolvimento Humano dos últimos seis anos, graças ao petróleo que descobriu no Mar do Norte; e criou uma estatal – Statoil – para desenvolver esta imensa riqueza em benefício do seu povo; e ainda criou um fundo soberano já superior a um trilhão de dólares para quando o petróleo deles acabar, o povo continuar bem economicamente.

Sabem os Estados Unidos, que a Petrobras bem administrada pode tornar o Brasil uma imensa Noruega em termos de desenvolvimento econômico e social. Os neoliberais negam isso afirmando que a Noruega é um país pequeno e de fácil administração. Mentira. A Noruega era um país pobre, mesmo com essas características, antes de descobrir o seu petróleo.

Portanto, se o Brasil, através da Petrobras, explorar o petróleo do pré-sal em favor do povo brasileiro pode se tornar um país hegemônico e, até grande concorrente dos Estados Unidos. Além de deixar de se manter como um celeiro de matérias-primas baratas para eles. Isto tem que ser impedido e faz parte da estratégia do Departamento de Defesa, conforme mostrado acima. Portanto, eles querem tirar o pré-sal do domínio do governo, privatizando a Petrobras. "Nós não queremos outro Japão na América Latina" dizia o mesmo Henry Kissinger.

3) Outro ponto causador dessa pressão sobre a Petrobras é o fato de que os Estados Unidos têm uma reserva de 40 bilhões de barris e consome mais de 8 bilhões por ano. Portanto, está numa grande insegurança energética e, por esse motivo, invadiram o Iraque, o Afeganistão e a Líbia.

O pré-sal pode ter uma reserva superior a 100 bilhões de barris, o que representa um alívio considerável para eles.

Por isso querem nos tomar essa riqueza junto com a tecnologia de exploração em águas profundas que a Petrobrás detém. Para tanto, querem que a empresa venda os seus ativos e fique enxuta para eles se apoderarem dela, comprando barato.

Estratégias para a privatização
Os fatos: em 1991, o banco Credit Suisse First Boston, que comandou a privatização da YPF da Argentina, apresentou ao governo Collor um plano estratégico para privatizar a Petrobrás sem despertar o nacionalismo dos brasileiros.

A Aepet traduziu e publicou esse documento. O plano consistia em privatizar as subsidiárias – Collor privatizou a Petrofértil, a Petromisa e os ativos da Petroquisa – depois dividir a holding Petrobrás em Unidades de Negócios, transformá-las em subsidiárias e vender cada uma. Collor caiu e Itamar sustou o processo e até mandou empregados defenderem o monopólio no Congresso.

FHC eleito em 1995 retomou enfaticamente o plano. Fez a Emenda Constitucional número 9, tirando da Petrobras a condição de executora única do monopólio da União. Elaborou o projeto de lei que se tornou a Lei 9478/97, cujo artigo 26 dá a propriedade do petróleo a quem produzir e gera o pior contrato do setor; vendeu 33% das ações da Companhia na Bolsa de Nova Iorque a preço absurdamente baixo; incentivou os Estados a venderem suas ações e, assim, o capital social da Petrobras saiu de 84% de propriedade do governo para 37% apenas, mantendo, porém, 51% das ações ordinárias com direito a voto em mãos do governo.

No governo Lula, com a capitalização decorrente de sete blocos da cessão onerosa, a propriedade do governo subiu para 48%.

Bolsonaro mandou o Banco do Brasil e a Caixa Econômica venderem suas ações e o percentual de propriedade do governo sobre o capital social da Petrobrás caiu para 36,75%.

Assim, os acionistas privados, maioria estrangeira, possuem 63,25% do capital social, sendo contemplados com dividendos absurdos provenientes de um lucro imoral obtido pela diretoria da Petrobras.

No período 1999 a 2001, com Henri Philippe Reichstul na presidência da Petrobras e Pedro Parente, presidente do Conselho de Administração, foi retomado o processo de privatização.

A empresa teve 62 acidentes graves em dois anos, contra uma série histórica de menos de um acidente grave por ano. Os acidentes jogavam a opinião pública contra a Petrobras, de modo que não houvesse reação contra a privatização.

O afundamento da P-36 foi um desses acidentes. Reichstul aumentou drasticamente o número de terceirizados na Companhia, podiam trabalhar até em áreas e atividades estratégicas, o que foi muito grave.

Reichstul e Parente dividiram a Companhia em 40 Unidades de Negócios a serem privatizadas. Chegaram a vender a primeira delas, a Refinaria Alberto Pasqualini – Refap, no Rio Grande do Sul.

Mas essa venda foi fruto de uma negociata absurda e o Sindicato dos Petroleiros, assessorado pela Aepet, ganhou uma liminar suspendendo o processo. Parou tudo, mas Reichstul e Parente chegaram a mudar o nome da Companhia para Petrobrax, visando facilitar a pronúncia dos futuros compradores. A eleição de 2003 impediria a continuidade do processo de privatização.

Veio golpe que derrubou a presidente Dilma e um dos chefes do golpe, Michel Temer, assumiu a Presidência e, dias depois da posse, segundo o Intercept Brasil, foi aos Estados Unidos receber orientações de como entregar as riquezas do Brasil.

Na volta, Temer nomeou Pedro Parente para a presidência da Petrobras e este, avidamente, retomou o processo de privatização que conduzia e que foi interrompido em 2003.

Parente vendeu ativos com prejuízo da ordem de R$ 100 bilhões, instituiu o PPI – Preço de Paridade de Importação, que faz a Petrobras vender os combustíveis ao preço internacional do petróleo acrescido das despesas de importação.

Como vimos nos artigos anteriores, a Petrobras está vendendo os derivados na refinaria por um preço absurdo. Assim, transfere recursos do povo brasileiro para acionistas privados, cuja maioria é de estrangeiros.

Recentemente, deu na mídia: "A Petrobras vai pagar ao governo R$ 31,5 bilhões em dividendos, de maio a julho de 2022". Isto significa que ela pagou mais de R$ 57 bilhões aos acionistas privados, pois eles detêm 63,25% do capital social da Companhia, sendo que a maioria dessas ações é de ações preferenciais.

Esse ganho absurdo faz parte da nova estratégia para jogar a empresa contra a opinião pública e privatizar.

O PIG, a imprensa golpista, proclama: "Se a Petrobras estatal vende os combustíveis a esse preço, o melhor é privatizar".

Essa fake news tem um efeito devastador contra a Companhia. Pesquisa recente, com citação dos possíveis culpados mostra isso: 65% dos entrevistados culpam a Petrobras pelo preço alto dos combustíveis, e 35% acham que é culpa do governo.

Ora, a Petrobras é uma empresa. Ela não decide nada. Quem toma as iniciativas danosas são os seus dirigentes, e esses são nomeados pelo governo. Então 100% da culpa é de quem nomeou os dirigentes da Companhia e não dela.

Aliás, O artigo 238 da Lei 6404 – Lei das AS – diz tacitamente: Art. 238 – A pessoa jurídica que controla a Companhia de economia mista (caso da Petrobras) tem os deveres e as responsabilidades do acionista controlador (artigos 116 e 117), mas poderá orientar as atividades da Companhia de modo a atender ao interesse público que justificou a sua criação.

Portanto, fica claro que o presidente da República é 100% culpado pelos preços abusivos que a direção da Petrobrás vem impondo ao país, transferindo renda do povo para acionistas privados e estrangeiros.

Conclusão
Os preços abusivos e o lucro imoral dos acionistas privados decorrem de duas imposições dos Estados Unidos: 1. Impedir que, através do pré-sal, a Petrobras promova o desenvolvimento do Brasil, mantendo-o como o maior fornecedor de matéria-prima barata para eles; 2. Transferir a propriedade da fonte mais importante de energia não renovável para ele, Estados Unidos – país mais hegemônico e poderoso – reduzindo a sua enorme e belicosa insegurança energética.

Fonte: AEPET-BA