Petrobras lucra R$ 54 bilhões em três meses. O que explica isso?

Por Eric Gil Dantas, economista do Ibeps

Por Eric Gil Dantas é economista do Ibeps e do Observatório Social do Petróleo

A Petrobrás anunciou nesta quinta-feira (28), mais um lucro líquido recorde, agora de R$ 54,3 bilhões para os meses de abril, maio e junho de 2022 – quase R$ 10 bilhões a mais do que os R$ 44,5 bilhões do primeiro trimestre deste ano. Somados, a estatal já tem um lucro líquido de R$ 98,9 bilhões em 2022 – quase o resultado de 2021, que havia sido o segundo maior lucro líquido de uma empresa em território nacional de toda a história.

A explicação está novamente em seu resultado operacional, com preços recordes do barril de petróleo e de derivados no mercado interno, o que fez a receita de venda de seus produtos aumentarem enormemente. Vejamos tudo isso em dados.

O preço do barril de petróleo

Como todos sabem, o barril de petróleo – assim como diversas outras commodities – tiveram forte aumento de preços desde o fim de 2020, com o término das primeiras ondas de Covid, e ganharam ainda mais força com a Guerra da Ucrânia. Do menor preço, no segundo trimestre de 2020, até o segundo trimestre de 2022 o brent saiu de 29 dólares para 114 dólares, ou seja, praticamente quadruplicou seu valor. Mesmo se compararmos aos anos de 2018 e 2019, quando o brent ficou em uma média relativamente alta, US$ 68, hoje seu patamar é praticamente o dobro. Além disto, desde 2019 o Real sofreu uma forte desvalorização cambial. No início de 2019 um dólar equivalia a R$ 3,77. No último ano a média do câmbio ficou em R$ 5,24 (para o 2tri/22 o real esteve relativamente apreciado, em R$ 4,92 por dólar, o que já não é mais a realidade, haja visto que hoje o dólar está em torno de R$ 5,30).

Esta combinação de brent elevado com câmbio depreciado, fez com que o barril de petróleo em reais chegasse ao seu maior patamar da história (quando o brent atingiu o pico de US$ 144 dólares, em 3 de julho de 2008, o câmbio estava em R$ 1,56, sendo assim, em reais é um patamar muito mais baixo do que o valor atual). Além disso, a Petrobras hoje produz 2,6 milhões de barris de óleo equivalente por dia, 8% a mais do que em 2008, por exemplo.

Gráfico 1 – Média trimestral do brent (em reais) – 1º trimestre de 2018 a 2º trimestre de 2022

Mesmo a Petrobrás utilizando a maior parte de sua produção de petróleo para as refinarias do país transformarem óleo em produto derivado, em geral a estatal repassa às refinarias (mesmo as suas) a preços internacionais, a exceção de períodos com pressão muito grande de preços. Hoje a Petrobras está passando para suas refinarias o óleo a US$ 106,90, 7 dólares a menos do que o mercado internacional.

O preço dos derivados de petróleo
O preço dos derivados também atingiu o seu maior nível, com o chamado “Preço derivados básicos - Mercado interno (R$/bbl)” chegou a R$ 665,50, muito superior ao período anterior, e mais do que o dobro de 2018, quando os caminhoneiros fizeram a histórica greve que paralisou o país contra os altos preços do diesel.

 Gráfico 2 – Preço derivados básicos - Mercado interno (R$/bbl) na média trimestral

Em síntese, com o maior patamar da história de preço de petróleo e de derivados, a Petrobras consegue uma receita imensamente superior. Em um ano as receitas de vendas da empresa subiram 54,4%. Se compararmos o trimestre imediatamente anterior, quando a Petrobras já teve um lucro líquido recorde, as receitas de vendas subiram mais 21%.

Importante pontuar que o total de vendas de petróleo e gás caiu 5,2% se comparado ao trimestre anterior e 6% se comparado ao mesmo período de 2021, e o de derivados aumentou apenas 1% e caiu 2,4%, fazendo as mesmas comparações. Ou seja, o que explica o lucro atual é o preço, e não o volume de vendas.

Privatizações também engordam o caixa
As privatizações encampadas pela gestão também são parte relevante da explicação do lucro da companhia. Só no segundo trimestre a Petrobras embolsou R$ 7,8 bilhões com as privatizações. De janeiro a junho já são R$ 17 bilhões em receitas vindas do desmonte da estatal.

É dinheiro vindo da entrega de ativos valiosíssimos como o Campo de Albacora Leste, Polo Potiguar, Polo Carmópolis, Polo Alagoas, Gaspetro e Reman.

Na prática, a privatização dos ativos está se transformando diretamente em dividendos para os acionistas da Petrobras. É uma visão de espólio, de vender o que der e embolsar o dinheiro o mais rápido possível.

 Lucro e dividendos
O recente pedido do Bolsonaro para adiantar dividendos das estatais para que ele possa financiar sua reeleição mostra a aliança de interesses entre o presidente e os acionistas. A Petrobras virou uma máquina de pagar dividendos, em 2021 ela entregou quase todo o seu lucro para os acionistas, e está repetindo o mantra também em 2022. Novamente, é espólio, é saquear o que der o quanto antes, não tem interesse sequer em reinvestir dinheiro, como qualquer empresa que pense minimamente no seu médio prazo.

A companhia já anunciou um novo pagamento de dividendos, o que fará com que em seis meses pague R$ 136 bilhões. Lembrando que a menor parte disto fica com o Estado brasileiro, pouco mais de um terço.

Tudo isso mostra como a economia brasileira está operando, são altos preços baseados unicamente em subida de preços, sem mudanças tecnológicas ou de produtividade real, retirando a renda da população e mesmo de outros setores da economia e concentrando nos setores de óleo e gás e de outras commodities. Simplificando, políticas como o PPI empobrecem a população para enriquecer uma pequena parcela de milionários e bilionários, boa parte deles inclusive de estrangeiros. Mas se a Petrobras é estatal, por que temos que manter isso?