É verdade que Bolsonaro está baixando o preço dos combustíveis?

Por Eric Gil Dantas, economista do OSP e IBesp

Por Eric Gil Dantas, economista do Observatório Social do Petróleo e do Ibeps

Na semana do dia 19 de junho, a gasolina e o diesel chegaram aos maiores preços nominais da história do país, custando na média nacional R$ 7,39 a gasolina comum e R$ 7,68 o diesel S-10. De lá pra cá a gasolina caiu R$ 1,65 e o diesel R$ 0,17. Ainda deve cair um pouco mais, principalmente após a nova redução de 18 centavos por parte da Petrobrás no preço da gasolina a partir desta terça-feira, 17.

Mas o que está fazendo o preço diminuir? Quanto disto decorre do corte de impostos estaduais e federais aprovados no Congresso e quanto disto é um movimento do mercado internacional? Será que Bolsonaro está mandando a Petrobrás baixar o preço artificialmente para aumentar suas chances eleitorais?

As evidências apontam para o oposto: não há interferência do Bolsonaro para baixar preços, até porque nunca houve a intenção. Aliás, com os cortes de impostos a Petrobrás está conseguindo cobrar até mesmo acima do PPI, o que não conseguia fazer há muito tempo. 

O efeito do corte de impostos
Em 23 de junho deste ano foi sancionada a Lei Complementar 194/2022, que determina a isenção de tributos federais e o teto do ICMS em 18% para combustíveis. Isto se somou à isenção de impostos federais para o diesel que já estava em vigor desde março.

O efeito da isenção de impostos federais (CIDE e PIS/COFINS) foi retirar 33 centavos do diesel s-10 e 69 centavos da gasolina. No diesel esta isenção feita ainda em março não foi perceptível ao consumidor final por conta dos novos aumentos do combustível. Em 11 de março a Petrobrás anunciou reajuste (aumento) de 90 centavos e em 10 de maio um novo reajuste (aumento) de 40 centavos. Tanto que, entre março e abril de 2022 o aumento médio do preço do diesel foi de 35 centavos.

Já o corte do imposto federal na gasolina ocorreu no final de junho, e já foi perceptível imediatamente. Como os estados começaram a cortar o ICMS no dia 1º de julho, o efeito no preço final ocorreu simultaneamente, então é difícil separá-los. O fato é que, entre a semana do dia 19 de junho (o pico do preço da gasolina) até a semana do dia 10 de julho (a semana anterior a nova redução da gasolina por parte da Petrobrás) a gasolina caiu R$ 1,32 – parte do corte dos impostos federais, parte do corte do ICMS. Há um outro elemento, que é a queda do preço internacional, que chega via importação, mas trataremos no próximo ponto.

Em síntese, a redução de impostos federais e estaduais impactou, ao menos parcialmente, ao preço final. Mas o maior efeito foi na gasolina, já que o teto do ICMS praticamente não teve efeito sobre o preço do diesel, tendo em vista que as alíquotas de diesel nos estados (à exceção do Amapá) não ultrapassavam 18%, e o imposto federal na gasolina era superior ao do diesel.

Mas por que os preços continuam a cair? 
Desde o mês de julho a Petrobrás anunciou três reduções do preço da gasolina e duas do diesel. Estas reduções vieram na sequência dos cortes de impostos, o que suscitou discussões sobre se isto comporia o arsenal eleitoral de Bolsonaro. Se esta hipótese fosse verdadeira, Bolsonaro finalmente estaria utilizando a Petrobrás como ferramenta para a redução de preços, impondo preços menores do que o PPI.

Apesar de ser uma hipótese tentadora, já que lidamos com um presidente que aparelha constantemente o Estado para aumentar suas chances eleitorais, os dados não confirmam isto. Inclusive esta hipótese parece pouco plausível, pois isto iria de encontro a duas importantes bases de sustentação do governo: (i) o mercado financeiro, que se beneficia diretamente dos preços exorbitantes dos combustíveis, transferidos como receitas através de dividendos da estatal aos acionistas privados; e (ii) o mercado de importadores de combustíveis, que necessitam do PPI para sustentar artificialmente a sua existência, ameaçada constantemente pela lógica estatal da Petrobrás.

Houve queda no preço internacional dos combustíveis, por isso que houve reduções nos preços por parte da Petrobrás. Do auge, em meados de junho, até hoje, o preço da gasolina no Golfo do México (EUA) – referência para o PPI – caiu 25%. Já o preço do diesel caiu 15%.

Lembrando que o PPI simula o preço de importação da gasolina e do diesel. Se o preço lá fora cai, em tese o preço dos combustíveis vendidos pela Petrobrás também cai. E por isso caiu, e não por interferência do Bolsonaro na Petrobrás.

Na verdade, o que a Petrobrás está fazendo hoje é exatamente o oposto. A direção da empresa está aproveitando que houve corte de impostos no preço final (e as pessoas prestam atenção no preço do posto de gasolina, e não o da refinaria) para manter preços mais elevados na refinaria, vendendo muitas vezes acima do próprio PPI.

O PPI estava politicamente difícil de sustentar, com preços chegando até 8 reais pela gasolina e pelo diesel. Com o corte de impostos federais e o ICMS, ficou muito mais fácil manter o PPI sem ruídos na sociedade. Se a gasolina chegou a ultrapassar os 8 reais em grande parte do país e agora está sendo vendida por menos de 6 reais, a Petrobrás deixa de ser foco de críticas da sociedade, “apaziguando” a guerra dos preços.

O desgaste com os altos preços fez com que a Petrobrás operasse vendendo gasolina e diesel abaixo do PPI desde o ano passado. Por ser uma estatal, não conseguia cobrar preços totalmente alinhados com o PPI em um contexto de preços internacionais tão elevados, diferente da Acelen/Mataripe, por exemplo. De janeiro a junho deste ano a Petrobrás vendeu diesel por volta de 9% abaixo do PPI e a gasolina por volta de 12% abaixo do PPI. Já a partir de julho, com todas as isenções tributárias postas e o preço internacional em queda, a Petrobrás começou a cobrar o preço do PPI na gasolina e cobrar em torno de 5% acima do PPI para o diesel S-10.

Isto mostra que não é o Bolsonaro que finalmente venceu a gananciosa direção da Petrobrás e seus acionistas privados. Não existe cruzada do Bolsonaro contra os acionistas da Petrobrás. O Caio Paes, assim como todos os seus antecessores, não estão lá para diminuir o lucro dos acionistas em prol do consumidor brasileiro, e sim para maximizar os ganhos do mercado. E está fazendo exatamente isso agora, vendendo combustível acima do PPI.

Como se esperava, as isenções tributárias serviram para assegurar o PPI, e não para combatê-lo. Se antes a Petrobrás não conseguia manter o PPI, agora consegue cobrar até acima do preço internacional. Ficou ainda mais claro que estamos tirando dinheiro dos serviços públicos para garantir ainda mais dividendos para os acionistas privados da Petrobrás. Mas agora com uma calmaria geral. O deus mercado e o Bolsonaro agradecem.