Regime de Previdência Complementar: Previsão constitucional e legislação infraconstitucional

Por Cacau Pereira - pesquisador do Ibeps

Por Cacau Pereira é pesquisador do Instituto Brasileiro de Estudos Políticos e Sociais (Ibeps)

Em 16 de dezembro de 1998, com a entrada em vigor da Emenda Constitucional n.º 20, o Regime de Previdência Complementar (RPC) ganhou novo status- passando a ter previsão constitucional - e uma série de medidas relacionadas à administração e ao controle dos fundos de pensão.
Somente em 29 de maio de 2001, por sua vez, é que foram aprovadas as leis complementares nº 108 e 109. Aparentemente, em ordem invertida, a Lei Complementar nº 108 trata das relações entre as patrocinadoras de entidades fechadas de previdência complementar (EFPC) de empresas públicas, sociedades de economia mista da administração direta e indireta, além dos próprios entes federados (União, estados, Distrito Federal e municípios) e seus respectivos fundos de pensão. Regulamenta o § 4.º do artigo 202 da Constituição Federal. 

Já a Lei Complementar n.º 109 revogou a Lei n.º 6.435/1977, regulamentou o caput do artigo 202 da Constituição e definiu as regras gerais sobre a previdência complementar no Brasil, tanto para as entidades abertas quanto para as entidades fechadas. É a lei, portanto, que regulamenta, de conjunto, o RPC. Trata de regras sobre planos de benefícios, da fiscalização das entidades, da intervenção e liquidação extrajudicial, do regime disciplinar e regras gerais da previdência complementar.

Posteriormente, essas leis sofreram alterações por força de outras emendas constitucionais. 

O artigo 1.º da LC 109 define o que é o Regime de Previdência Complementar:
Art. 1.º O regime de previdência privada, de caráter complementar e organizado de forma autônoma em relação ao regime geral de previdência social, é facultativo, baseado na constituição de reservas que garantam o benefício, nos termos do caput do art. 202 da Constituição Federal, observado o disposto nesta Lei Complementar.
Inicialmente, destaco que a expressão “complementar” não é a melhor, embora tenha se consagrado e é forma largamente utilizada. Trata-se de uma previdência de natureza privada ou particular e, neste sentido, de caráter distinto da previdência pública. Pode ter ou não caráter supletivo, a depender da modalidade, do plano ou tipo de benefício.
Mas, questões linguísticas à parte, os dois termos são utilizados como sinônimos e, tanto no texto constitucional quanto na legislação infraconstitucional, vemos as expressões previdência complementar e previdência privada.

O artigo 2.º define o papel das operadoras do RPC:
Art. 2.º O regime de previdência complementar é operado por entidades de previdência complementar que têm por objetivo principal instituir e executar planos de benefícios de caráter previdenciário, na forma desta Lei Complementar.

Já os incisos I a VI do artigo 3.º definem os objetivos da ação do Estado:
I - formular a política de previdência complementar;
II - disciplinar, coordenar e supervisionar as atividades reguladas por esta Lei Complementar, compatibilizando-as com as políticas previdenciária e de desenvolvimento social e econômico-financeiro;
III - determinar padrões mínimos de segurança econômico-financeira e atuarial, com fins específicos de preservar a liquidez, a solvência e o equilíbrio dos planos de benefícios, isoladamente, e de cada entidade de previdência complementar, no conjunto de suas atividades;
IV - assegurar aos participantes e assistidos o pleno acesso às informações relativas à gestão de seus respectivos planos de benefícios;
V - fiscalizar as entidades de previdência complementar, suas operações e aplicar penalidades; e
VI - proteger os interesses dos participantes e assistidos dos planos de benefícios.
A previdência complementar não é um direito trabalhista, não integra o contrato de trabalho dos participantes, sendo, portanto, relações independentes. Consequentemente, a celebração do contrato de trabalho não implica a adesão automática do empregado ao plano de previdência complementar do empregador.

O participante pode aderir a um plano de previdência complementar e dar continuidade ou não, de forma autônoma, em relação ao seu contrato de trabalho. As contribuições do empregador ao plano previdenciário não são consideradas salário indireto. As reservas acumuladas em favor do participante não são consideradas como remuneração por ocasião da rescisão do contrato de trabalho e a relação civil-previdenciária entre participante x patrocinador não se confunde com a relação empregado x empregador.

Os direitos e obrigações dos participantes e assistidos estão definidos no Regulamento do Plano de Benefícios e além das condições expressas neste documento, os participantes e assistidos têm os seguintes direitos (PREVIC, 2019):
- pleno acesso às informações relativas à gestão do patrimônio do plano de benefícios;
- proteção do Estado em relação à defesa dos seus direitos;
- inserção nos Conselhos Deliberativos e Fiscal das Entidades Fechadas de Previdência Complementar.

Dentre as responsabilidades dos participantes e assistidos está a de demandar a qualidade da governança da EFPC visando o gerenciamento adequado dos planos de benefícios.