Sob Lula, Petrobrás recua em privatização e busca ampliar domínio do Estado nas refinarias

Fim de uma era

Iniciado há dois anos, durante o governo de Jair Bolsonaro (PL), o processo de privatização de oito das 13 de refinarias que tinham participação da Petrobras pode ser abandonado de vez e até desfeito na gestão de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Depois de o Ministério de Minas e Energia suspender, no início do ano, a venda de ativos da petroleira, em novembro a estatal decidiu desfazer um contrato já assinado de transferência do controle de uma refinaria. Ao mesmo tempo, a empresa pediu ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) a renegociação de um termo de compromisso de cessação (TCC) no qual havia se comprometido a reduzir sua participação no mercado de refino.

O acordo, costurado no mandato de Michel Temer (MDB), foi assinado pela Petrobras para suspender um inquérito administrativo no qual o Cade investigava suposto abuso de posição dominante no setor. Assinado em junho de 2019, o documento estabelecia um intervalo de dois anos para o processo de desinvestimento, mas aditivos prorrogaram o prazo.

Até 2021, 13 das 17 refinarias que operam no Brasil pertenciam à Petrobras, que concentrava quase a totalidade do mercado. Entre janeiro e setembro daquele ano, as refinarias da estatal responderam por 98,9% de toda a produção de derivados de petróleo no país, segundo dados da Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).

Após a assinatura do TCC, quatro unidades de refino chegaram a ser negociadas. Em outubro de 2021, a, titularidade da operação da Refinaria Landulpho Alves (RLAM), na Bahia, foi transferida da estatal para a Refinaria de Mataripe, controlada pela Acelen, do fundo Mubadala.

Já a Unidade de Industrialização do Xisto (SIX), no Paraná, e a Refinaria Isaac Sabbá (Reman), no Amazonas, tiveram seus processos de venda concluídos em 4 e 30 de novembro do ano passado.

A venda da Refinaria Lubrificantes e Derivados de Petróleo do Nordeste (Lubnor) para o consórcio Grepar Participações foi acertada com Petrobras ainda em maio do ano passado, mas desde que a transação foi aprovada pelo Cade, em 22 de junho deste ano, a estatal vinha adiando a conclusão do negócio.

No último dia 27, a empresa anunciou a decisão de rescindir o contrato, alegando, em comunicado, “ausência de cumprimento de Condições Precedentes nele estabelecidas até o Prazo Final definido em tal contrato (25/11/2023), em que pesem os melhores esforços empreendidos pela Petrobras para conclusão da transação”.

Localizada em Fortaleza, a unidade tem capacidade de processamento autorizada de 8,2 mil barris/dia e é uma das líderes nacionais em produção de asfalto e a única a produzir lubrificantes naftênicos. O negócio havia sido fechado pelo valor de US$ 34 milhões.

Em nota, a Grepar disse ter sido pega de surpresa pela decisão e afirmou que adotará “medidas jurídicas para resguardar os seus direitos de ser indenizada pelas perdas e danos que a Petrobras de forma deliberada lhe causou, frustrando negócio já contratado”.

Governo avalia recompra de refinarias já privatizadas
O interesse do governo em manter o domínio do mercado de refino pode não parar por aí. O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, já defendeu, em diversas ocasiões, a recompra das refinarias já repassadas à iniciativa privada.

No fim de setembro, ele disse que essa seria uma forma de reduzir a dependência de diesel importado.

“Nós estamos trabalhando várias frentes para isso. Uma é reforçar o interesse nosso de política pública, de que a Petrobras seja rápida na modernização dos seus parques de refino e que avalie a possibilidade, inclusive já é pública a minha opinião, de que a Petrobras deve negociar com aquelas refinarias que foram privatizadas para que, dentro de regras de mercado – porque nós queremos respeitar a segurança jurídica, a estabilidade regulatória – ela possa readquirir essas refinarias”, disse.

No início do mesmo mês, em uma nota divulgada pelo Ministério de Minas e Energia (MME), Silveira já havia defendido especificamente a recompra da RLAM.

“Entendemos do ponto de vista da segurança energética e da nova geopolítica do setor de petróleo e gás, respeitadas as regras de governança da companhia, que a Petrobras deve avaliar recomprar a RLAM. É um ativo histórico e que fez parte da estratégia de desmonte do Sistema Petrobrás e nunca deveria ter sido vendido”, declarou.

Em maio, durante evento em Salvador, ele já havia levantado essa possibilidade. “A maior refinaria da Bahia foi vendida ao capital privado. Eu, particularmente, se depender do ministro das Minas e Energia, da sua vontade como cidadão brasileiro, mas apaixonado pela Bahia, essa refinaria deveria voltar a ser da Petrobrás”, disse.

As outras quatro refinarias que estavam no plano de desinvestimento da companhia eram a Gabriel Passos (Regap), em Minas Gerais; a Abreu e Lima (RNEST), em Pernambuco; a Alberto Pasqualini (Refap), no Rio Grande do Sul; e a Presidente Getúlio Vargas (Repar), no Paraná.

Em novembro de 2022, a equipe de transição do novo governo chegou a solicitar a suspensão dos processos de transferência de ativos em andamento. Na ocasião, no entanto, a Petrobrás divulgou nota negando qualquer decisão sobre a suspensão do programa de desinvestimento. A conclusão da venda da Reman, aliás, ocorreu após o pedido da equipe do governo eleito.

À época, enquanto integrante do grupo de Minas e Energia da equipe de transição, sob o atual presidente da companhia, Jean Paul Prates, ex-senador do PT, aventou até mesmo a possibilidade de construção de novas unidades de refino.

No plano de governo protocolado no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em 2022, o então candidato do PT defendia uma nova política de preços de combustíveis e de gás de cozinha que estivesse alinhada a um aumento na produção de derivados de petróleo no país. Já no relatório final do gabinete de transição governamental, apresentado em dezembro do ano passado, a venda de refinarias foi criticada por reduzir o espaço de atuação estatal.

Em maio deste ano, a Petrobrás anunciou o fim do regime de preço de paridade de importação, conhecido pela sigla PPI e que estava em vigor desde 2016.

Fonte: Gazeta do Povo