Seminário relembra as greves de 1995 e 2015 e destaca coragem, memória e legado dos petroleiros e petroleiras

Muita história para contar

O Sindipetro-Litoral Paulista realizou no último sábado (22) um seminário especial dedicado às greves de 1995 (deflagrada em 3 de maio daquele ano) e 2015 (iniciada em 29 de outubro) — dois marcos fundamentais na história da categoria petroleira. Organizado pelo Departamento de Política e Formação Sindical do sindicato, o encontro reuniu trabalhadores e trabalhadoras que viveram os dois períodos, dirigentes atuais, aposentados, convidados de entidades parceiras e pesquisadores, num ambiente de memória viva, análise política e reafirmação do compromisso histórico na defesa da Petrobrás e da soberania nacional. O seminário também contou com a participação, via Teams, de Averaldo Meneses de Almeida, coordenador do Sindipetro-LP à época da greve de 1995, que compartilhou lembranças, desafios e aprendizados daquele período de enfrentamento. 

Abertura: história, identidade e resistência
Logo na abertura, o coordenador geral Márcio André destacou a importância do seminário como homenagem aos lutadores e lutadoras que ergueram a trajetória do sindicato. Recordou que, mesmo antes de 1995, a RPBC já era “ponta de lança” nas mobilizações ainda na ditadura. Essa força histórica, segundo ele, moldou não apenas a identidade das diretorias sindicais e da categoria, mas a própria proteção da Petrobrás contra projetos de privatização.

A diretora Stefhanie Merino lembrou que sua geração, ingressa na empresa a partir de 2016, aprendeu sobre a luta com nomes como Realino De Oliveira Júnior, Maria Helena Fernandes Faria, Valdemir Rio Lamarck e tantos outros que transmitiram, no dia a dia da refinaria, o valor da organização de base. Para ela, contar essas histórias é essencial para formar uma nova geração que compreenda o tamanho da responsabilidade que herdou.



1995: quando a RPBC se preparou para enfrentar o Exército — e um petroleiro percebeu que poderia ter lutado contra o próprio pai
A greve de 1995 foi lembrada como um dos momentos mais dramáticos e perigosos já vividos na Petrobrás. Durante 33 dias, trabalhadores ocuparam a RPBC, enfrentando ameaças reais de invasão militar em meio ao projeto privatista do governo FHC. Quem esteve no seminário pôde ouvir, dos próprios protagonistas da luta, as histórias contadas por Armando Munford, Realino e Walmir Rodrigues dos Santos (o Barriga de Pau), que revelaram detalhes impressionantes da preparação dos trabalhadores para resistir caso tropas tentassem assumir a refinaria pela força.

Realino e o plano da piridina: a defesa química improvisada
Quando se espalhou o boato de que tropas do Exército estavam a caminho de Santos e São Vicente para tomar a RPBC, operadores e laboratoristas sabiam que não poderiam enfrentar fuzis com as mãos vazias. Foi então que Realino, técnico do laboratório, concebeu uma estratégia tão ousada quanto criativa.

Ele e Aparecido Pimenta, um dos petroleiros lembrados entre os homenageados do dia, correram ao laboratório e encheram garrafas de piridina — um líquido usado para neutralizar HF, com um odor extremamente forte e nauseante.
“Se o Exército entrar, vamos jogar piridina. Ninguém aguenta o cheiro daquilo.”

A ideia não era ferir ninguém, mas criar uma barreira química improvisada para desorientar e afastar os soldados. Realino descreveu o plano com simplicidade e coragem:
“Era o que tínhamos. Era isso ou deixar os caras tirarem a gente à força.”, lembrou.

Walmir Rodrigues dos Santos, o Barriga de Pau: do quartel à greve — o dia em que percebeu que poderia ter sido treinado para atacar o próprio pai
Um dos relatos mais fortes e emocionantes do seminário foi o de Walmir Rodrigues dos Santos, personagem histórico da RPBC, conhecido por quase toda a categoria apenas pelo apelido Barriga de Pau — tão marcante que muitos só descobriram seu nome completo durante o próprio evento.

Antes de entrar na Petrobrás, Walmir serviu ao Exército e trouxe à tona uma lembrança que havia guardado por décadas. Ele contou que, ainda no período pós-ditadura, ouviu de um coronel que o treinamento da tropa tinha um propósito muito claro:
“Estamos treinando vocês para enfrentar comunistas.”

Esse treinamento, com baioneta calada, era voltado a criar soldados capazes de atacar o “inimigo interno”.
Anos depois, já como operador da RPBC, Walmir descobriu que o próprio pai havia participado de mobilizações e greves na década de 1980 — e então, como ele mesmo disse, “caiu a ficha”. Ele percebeu que, naquele ambiente militar, estava sendo preparado para lutar contra pessoas como o seu pai, um petroleiro, um trabalhador, alguém exatamente do lado contrário de onde ele sempre deveria ter estado:

“Eu percebi que, naquele treinamento, eu podia estar sendo preparado para atacar o meu pai. Um petroleiro. Um trabalhador como eu”, relatou, numa fala que emocionou o auditório.

E quando a greve de 1995 trouxe de volta a possibilidade real de que o Exército invadisse a refinaria, essa lembrança emergiu com ainda mais força. Toda a carga simbólica daquele treinamento agora fazia sentido:
“Se eu tivesse seguido no Exército, eu poderia estar vindo invadir aqui. Contra minha própria família. Contra meus companheiros”, concluiu, deixando evidente o peso emocional e político daquele período.


Depois desse momento íntimo e profundo, Walmir passou a relatar como os trabalhadores se organizaram tecnicamente para impedir que o Exército assumisse a planta, caso a invasão realmente acontecesse. Ele descreveu com clareza o plano de recuo para a Caixa de Força, um local extremamente técnico da refinaria, onde apenas operadores experientes saberiam atuar:

“Se eles entrassem, todo mundo ia correr pra Caixa de Força. Ali só operador sabe mexer”, explicou.

Isso garantia que qualquer tentativa de assumir a operação seria impossível para uma tropa externa.

Além disso, eles prepararam barreiras improvisadas com vapor DSU, o vapor de alta pressão usado na planta:

“Colocamos vapor DSU nas escadas. Se subissem, iam tomar vapor na cara”, disse Walmir, lembrando que o objetivo não era machucar, mas impedir o avanço e proteger a integridade da planta.
Em paralelo, operadores ficaram posicionados nas caldeiras, prontos para abrir válvulas de escape caso necessário:

“O jato joga o cara pra trás”, explicou, reforçando que o efeito era principalmente impedir que avançassem.

As equipes também montaram barricadas e bloqueios improvisados, já que, com a retirada da vigilância externa pela empresa, a entrada das tropas se tornara tecnicamente mais fácil.

O Exército, contudo, jamais entrou. Segundo a avaliação de Walmir e Realino, três fatores foram decisivos para evitar o pior: a memória traumática da invasão da CSN (TSM), onde mais de trinta trabalhadores foram mortos; o risco real de explosão caso soldados operassem equipamentos sem conhecimento técnico; e o temor político de transformar petroleiros em mártires, acendendo uma crise nacional de grandes proporções.

Como sintetizou Realino:
“Se entrassem, iam transformar trabalhador em mártir. E sabiam disso.”

Assim, a RPBC não viveu um confronto armado, mas viveu algo tão intenso quanto: a preparação concreta, técnica e emocional para resistir a uma intervenção militar. Foi um episódio que consolidou, na memória coletiva da categoria, a força, a inteligência e a coragem que marcaram a greve de 1995 — uma história que, graças a relatos como o de Walmir, permanece viva para as gerações atuais e futuras.

2015: quando a categoria mudou o jogo e surpreendeu a Petrobrás
A parte da tarde foi dedicada à greve de 2015, que explodiu em um cenário conturbado: crise econômica global, queda abrupta do barril, Lava Jato, inflação alta e, principalmente, uma gestão da Petrobrás que já demonstrava sinais claros de desmonte interno e de alinhamento às pressões do mercado internacional.

O economista Eric Gil Dantas, do IBEPS, apresentou um panorama técnico e político que ajudou a situar a greve dentro de um quadro muito maior — um quadro que, à época, parecia conjuntural, mas que hoje sabemos que fez parte de um projeto deliberado de entregar ativos, reduzir o papel estatal da Petrobrás e abrir cada vez mais espaço para o setor privado na cadeia energética nacional.

Eric começou lembrando que o Brasil vivia, até 2014, o final do chamado superciclo das commodities, período em que preços internacionais altos permitiram grandes investimentos no pré-sal e alimentaram a expectativa de que a Petrobrás se tornaria uma das maiores produtoras do mundo. Mas, a partir de junho daquele ano, tudo mudou.

O barril do Brent despencou 61% em apenas seis meses — de 115 para 45 dólares — chegando depois ao fundo histórico de 26 dólares. Para o economista, essa queda não foi acidental: a OPEP aumentou a produção para pressionar o shale americano, iniciando uma guerra geopolítica de preços. Mesmo sendo produtora, a Petrobrás sofreu duramente, pois seus investimentos eram de longo prazo e sua receita dependia do barril.

Somada a isso, a valorização acelerada do dólar — que saltou de R$ 1,67 em 2011 para R$ 3,33 em 2015 — ampliou a dívida da empresa de forma artificial, já que grande parte dela era dolarizada. E, no âmbito interno, a Petrobrás atuava como instrumento de controle inflacionário: entre 2012 e 2014, vendeu gasolina e diesel abaixo do custo. Essa política ajudou a segurar a inflação para proteger o bolso da população, mas drenou o caixa da companhia.

Como se não bastasse, esse cenário coincidiu com o início da Operação Lava Jato, que, além de impacto reputacional, paralisou contratos, afastou fornecedores e gerou um ambiente de instabilidade institucional. Eric classificou esse componente como um “quarto fator desestabilizador”, que travou obras, congelou investimentos em refinarias e plataformas e fortaleceu narrativas que colocavam a Petrobrás como “problema” — preparando terreno político para ataques futuros.

Mas o ponto mais forte da análise de Eric foi mostrar que aquele período não foi apenas um amontoado de crises externas: foi também um terreno fértil para o avanço de uma agenda interna de privatizações, que já se articulava dentro da empresa e que viria a se intensificar nos governos seguintes. O que em 2015 parecia apenas uma gestão autoritária e repressiva mostrou-se depois como o início de um ciclo de desmontes, confirmado pelas ações dos governos Temer e Bolsonaro:
•    a venda da Liquigás,
•    a privatização da BR Distribuidora,
•    a entrega de campos terrestres de petróleo,
•    o fechamento de plantas estratégicas, como fábricas de fertilizantes,
•    a venda de refinarias,
•    e a desmontagem de setores inteiros ligados à logística, distribuição e gás.

Tudo isso colocou o país em maior dependência do mercado internacional e reduziu a presença da Petrobrás em áreas estratégicas para a soberania energética — justamente aquelas que, historicamente, a categoria defendeu com unhas e dentes.

Atualmente, parte desses ativos está sendo reincorporada pela empresa, graças à mudança de governo e à virada de direção estratégica. Mas, para a categoria, isso não significa baixar a guarda. Pelo contrário: acende o alerta. A retomada vem acontecendo
muitas vezes com mão de obra terceirizada, contratos frágeis e arranjos que não devolvem à Petrobrás o papel integrado e soberano que ela sempre teve. Ou seja: há avanços importantes, mas também existe o risco real de que o veneno da precarização — deixado pelo ciclo privatista — continue circulando dentro da estrutura da empresa. E, se a categoria não mantiver vigilância e pressão organizada, o que deveria ser reconstrução pode virar apenas remendo, deixando intacta a lógica que enfraquece direitos, segurança e o próprio caráter público da Petrobrás.

A partir disso, Eric mostrou que a crise de 2015 — frequentemente usada para justificar retrocessos — não foi causada pelos trabalhadores, nem pelos investimentos feitos na expansão da Petrobrás, mas sim pela combinação entre guerra geopolítica, câmbio explosivo, política macroeconômica e a exploração política da Lava Jato.

Nas palavras do economista, a greve de 2015 “não surgiu no vazio”: ela foi a reação legítima de quem estava na linha de frente enquanto setores poderosos, dentro e fora do Estado, preparavam um ataque profundo à Petrobrás como empresa integrada, pública e estratégica.

Mesmo diante desse cenário adverso, Eric concluiu destacando que a greve de 2015 se tornou uma das mais importantes do período pós-constituição, justamente por ter resistido a forças econômicas, políticas e midiáticas que pressionavam para transformar crise conjuntural em justificativa para retirada de direitos e privatizações permanentes. A mobilização, segundo ele, só conquistou o que conquistou porque a categoria enxergou o que muitos ainda não viam: que a defesa de direitos e a defesa da Petrobrás eram — e continuam sendo — a mesma luta.


A greve que virou a mesa
Segundo relatos de ex-diretores e trabalhadores e trabalhadoras da época, a greve de 2015 foi construída com uma tática inovadora: mobilização simultânea em todas as bases — RPBC, Alemoa, Pilões, UTGCA, Tebar e os prédios administrativos. A empresa, acostumada a greves previsíveis, não esperava isso.

Um dos personagens que ajudaram a criar o clima para a greve de 2015, o ex-diretor Fábio “Farofa”, que não esteve presente no seminário por questões pessoais, mas enviou um vídeo relatando aquele momento, destacou:
“A empresa já sabia como seriam as greves. A gente mudou o paradigma.”

São Sebastião: a única base do país que parou 100%
O depoimento do dirigente aposentado Douglas Braga mostrou como São Sebastião entrou pra história ao paralisar toda a operação. Supervisores e coordenadores aderiram — algo raríssimo e ousado — e nenhum bombeio funcionou. Plataformas ficaram sem escoamento, navios não atracaram e refinarias não receberam produto.

“Foi 100% parado. Nunca tinha ocorrido.”

UTGCA: quando o gás parou
Durante o seminário, Eduardo Lara, diretor do Sindipetro-LP e técnico de operação da UTGCA, resgatou um dos episódios mais importantes da greve de 2015: o papel decisivo da unidade de Caraguatatuba na paralisação nacional e a articulação jurídica montada às pressas para impedir que a Petrobrás desmontasse o movimento ainda nos seus primeiros passos. Lara lembrou que a paralisação no Litoral Norte não foi apenas simbólica: foi técnica, estratégica e corajosa, porque a UTGCA conseguiu interromper o escoamento de GLP, gás e C5+, travando uma parte fundamental da cadeia produtiva do pré-sal.

“A gente parou a planta. Paramos o gás de cozinha, paramos o C5+. Tinha polícia, tinha pressão, tinha interdito proibitório… e mesmo assim seguramos”, relatou, destacando que aquela resistência virou referência nacional.

Segundo ele, a Petrobrás tentou, desde o primeiro dia, quebrar a greve pela via judicial, com uma liminar que, se fosse executada imediatamente, teria destruído os piquetes. Para a infelicidade da empresa, a liminar não foi deferida pela Justiça do Trabalho naquele primeiro momento, o que permitiu a resistência dos trabalhadores e a manutenção dos piquetes — exatamente o que a categoria precisava para sustentar a greve de verdade.

Foi então que começou a parte da história definida como “a greve que ninguém vê”. Ao lado do advogado Nelson Ricardo Vieira Cândido, foi montado um verdadeiro quartel-general jurídico dentro do Fórum Trabalhista de Caraguatatuba, instalado discretamente na sala da OAB, observando diretamente a movimentação do juiz e da advogada da Petrobrás, analisando cada conversa de corredor, cada despacho que entrava e saía, cada gesto que indicasse quando a liminar seria cumprida.

“Ficamos ali, dentro da sala da OAB, acompanhando tudo. Víamos a conversa, víamos a movimentação… ali a gente ganhou tempo”, afirmou.

Esse tempo foi crucial. A sapiência dos diretores Edmilson Carmelito e Tiago Nicolini, associada à presença e intervenção fundamental do advogado Nelson dentro do Fórum, retardou a execução da liminar o suficiente para que os piquetes da UTGCA, São Sebastião, Pilões, Alemoa e RPBC estivessem firmes e organizados.

A estratégia evitou que a Petrobrás desmontasse o movimento antes que a greve tomasse corpo. Foi, como Lara resumiu, “a parte da greve que sustenta tudo”.
“Quem estava lá sabe. Se não tivesse aquela sala da OAB, se não tivesse aquela pressão jurídica, a greve não tinha acontecido do jeito que aconteceu”, finalizou o dirigente.


O episódio do EDISA: a greve que ganhou o Jornal Nacional
Um dos momentos mais marcantes foi o confronto na portaria do EDISA Valongo, em Santos, quando a PM tentou forçar a entrada de trabalhadores e acabou gerando uma crise que repercutiu nacionalmente. Farofa e o diretor Fábio Mello foram presos, e a imagem viralizou em telejornais e redes sociais.

“Não era pra ser um movimento grande. Mas a reação da polícia virou combustível pra categoria”, explicou Farofa.

A participação do diretor Fábio Mello trouxe ao seminário uma leitura contundente sobre o significado da greve de 2015 para a história da categoria. Em sua avaliação, a greve de 2015 foi a mais vitoriosa já realizada pelos petroleiros e petroleiras.
Mello comparou diretamente com 1995 — greve histórica e corajosa, mas que terminou com demissões, punições e um rastro de sofrimento — e explicou que, ao contrário da tragédia daquele ano, em 2015 a categoria conseguiu arrancar conquistas reais, enfrentar a empresa em pé de igualdade e sair fortalecida, mesmo em um dos cenários econômicos e políticos mais duros desde a redemocratização.

Para ele, o que tornou a greve de 2015 tão vitoriosa não foi apenas sua dimensão ou seu impacto operacional, mas o resultado concreto que ela produziu. Em meio à queda brutal do barril, à Lava Jato corroendo a imagem da Petrobrás e à pressão do mercado para cortar direitos, a empresa tentou impor perdas e congelar negociações. E foi exatamente aí que a greve virou o jogo.

Mello destacou que a paralisação ocorreu justamente porque a direção da companhia cometeu aquilo que ele chamou de “um erro estratégico”: apostar que a categoria aceitaria passivamente a falta de negociação.

“A greve de 2015 se deu mais por um erro estratégico da Petrobrás: o erro de não negociar”, recordou.

Segundo ele, a empresa acreditou que, com a ultratividade ainda vigente, poderia empurrar a categoria para um beco sem saída. O tiro saiu pela culatra.

A resposta veio de forma organizada, coordenada e com alto grau de mobilização. As bases pararam juntas, a categoria mostrou unidade e a Petrobrás rapidamente percebeu o custo político e operacional de ter ignorado os trabalhadores. Foi uma greve que rompeu a lógica de submissão ao mercado e provou que, quando mobilizada, a categoria petroleira tem força para interferir no rumo da empresa e do país.

Mello destacou que a própria direção da Petrobrás nunca mais repetiu aquele erro: 2015 ensinou que a tentativa de atropelar a categoria pode custar caro — e que os trabalhadores sabem se fazer ouvir quando precisam.

Para ele, a greve de 2015 permanece como referência porque mostrou o tamanho da Petrobrás enquanto projeto de nação e o tamanho da categoria enquanto força coletiva. Em meio a um ambiente adverso, repleto de ataques externos e internos, os petroleiros e petroleiras provaram que vitória se constrói com coragem, estratégia e unidade, e que nenhuma crise — econômica, política ou fabricada — é capaz de apagar a história de luta dessa classe trabalhadora.


Uma leitura necessária: por que 2015 e 1995 ainda ensinam tanto
Cacau Pereira, advogado, pesquisador e integrante do IBEPS, trouxe ao seminário uma análise política e econômica fundamental para compreender tanto o contexto das greves passadas quanto os desafios presentes, especialmente no ACT 2025.

Ele iniciou destacando que, ao contrário do que se poderia imaginar, não é a economia que tem ditado o ritmo das negociações coletivas no Brasil, mas sim a política — particularmente o avanço da extrema direita e suas pautas conservadoras:
“O elemento que vem dominando o Brasil há algum tempo é essa emergência da extrema direita, suas pautas conservadoras, os ataques via Congresso Nacional…”

Cacau explicou que estamos vivendo um momento peculiar: apesar de a inflação estar relativamente controlada e certos indicadores econômicos parecerem estáveis, isso não se traduz automaticamente em ganho real para os trabalhadores:
“A estabilidade econômica não necessariamente significa melhoria de renda para os trabalhadores.”

Ele apresentou dados nacionais mostrando que a imensa maioria das categorias profissionais tem conquistado apenas a reposição da inflação, e mesmo assim com muita dificuldade. Segundo ele, os reajustes reais no país são baixíssimos, em torno de 1%, nível insuficiente para recompor perdas acumuladas.

Cacau explicou ainda a estratégia nacional das empresas e do governo nas negociações coletivas recentes:
“Há uma política para esse ano que é a de ganhar tempo, de não ter grandes turbulências nas negociações, mas conduzir um beco sem saída que obriga a aceitar de galope as coisas no final.”

Ele mostrou que isso aconteceu com diversas categorias do funcionalismo, e que a Petrobrás está reproduzindo a mesma postura: empurrar a negociação até o limite do calendário, desgastar psicologicamente os trabalhadores e fechar o acordo quando já não há margem para grandes mobilizações.

Além da análise política, Cacau se emocionou ao participar do evento, deixando claro que enxerga as greves de 1995 e 2015 não apenas como fatos históricos, mas como momentos formadores de consciência:
“Eu tô visivelmente emocionado… não só como pesquisador, mas como alguém que estudou a greve e convive com essa categoria.”

Conclusão: memória viva para enfrentar o presente
O seminário mostrou que tanto a greve de 1995 quanto a de 2015 não foram apenas paralisações: foram escolas de luta. Foram feitas de coragem, estratégia, inteligência técnica e, principalmente, solidariedade. Relembrar essas histórias — especialmente os dramas vividos por trabalhadores como Walmir, Realino, Averaldo e tantos outros — é reafirmar que a força da Petrobrás sempre esteve na sua gente.

Os relatos e histórias contados até aqui mostram dois momentos decisivos da trajetória petroleira, vistos a partir das trabalhadoras e trabalhadores do Litoral Paulista. E deixam clara uma verdade que atravessa gerações: as greves de 1995 e 2015 foram muito maiores do que cada base isoladamente. Foram movimentos nacionais, com particularidades próprias em cada sindicato, cada unidade operacional, cada refinaria, cada plataforma. São histórias que cada base carrega — e que cada base deveria continuar contando para manter viva a chama da luta de classes e mostrar, para petroleiros do passado, do presente e do futuro, o tamanho da força coletiva quando a categoria está unida.

E é justamente dessa memória — construída na resistência, na dor, na ousadia e na inteligência organizativa — que nasce a preparação para os desafios do presente: o ACT 2025, o combate à terceirização, a luta por condições dignas de trabalho, a defesa da soberania energética e a construção de uma Petrobrás pública, inclusiva e a serviço do povo brasileiro.

Porque nenhuma greve acontece do nada.
Nenhuma conquista cai do céu.
E nenhuma categoria se fortalece sem conhecer — e honrar — o caminho que a trouxe até aqui.